Qui, 08 Jun - 17h44
ESTRÉIA-"Pergunte ao Pó" abranda tom noir do livro de John Fante
Por Sheri Linden
SANTA BARBARA (Hollywood Reporter) - Muito admirado por Charles Bukowski e ocupando um lugar de respeito na literatura de Los Angeles, o romance de John Fante "Pergunte ao Pó", de 1939, revela a poesia ferida, mas cheia de esperança dos sonhos dos "outsiders".
O caso de amor e ódio apresentado no livro -- cuja adaptação para o cinema estréia nesta sexta-feira-- envolve não apenas a disputa entre o escritor Arturo Bandini e a garçonete Camilla Lopez, mas também a tensão entre a América branca, protestante e anglo-saxônica e o resto do país, a vergonha e o autoconhecimento, a própria cidade de Los Angeles e todo o selvagem continente americano.
O roteirista Robert Towne, grande cronista de Los Angeles em "Chinatown" e "Shampoo", pode parecer o nome perfeito para traduzir esse livro importante para a tela grande, assinando tanto o roteiro quanto a direção.
E ele até certo ponto o é, apesar de, por razões inexplicáveis, ter abrandado o tom noir do livro, caindo no melodrama e deixando de se aprofundar o suficiente nos personagens.
Em todo caso, esse quarto trabalho de Towne como diretor é uma evocação excepcionalmente bela da Los Angeles dos anos 1930 (filmada na África do Sul), com o diretor de fotografia Caleb Deschanel ("A Paixão de Cristo") envolvendo as imagens em um brilho desértico dourado, criando um ambiente de sonho tão granulado quanto a areia do deserto de Mojave que permeia as ruas da cidade.
O filme é fiel ao clima de sofrimento sombrio do livro, mas nem o roteiro nem os atores conseguem aprofundar os personagens.
A história começa quando Arturo Bandini (Colin Farrell), sobrevivendo à base de laranjas e cigarros e com seis semanas de atraso em seu aluguel, reflete sobre o que fazer com sua última moeda.
Cinco meses se passaram desde que o jovem bonito chegou a Los Angeles, vindo do Colorado, munido de grandes esperanças, uma máquina de escrever e uma mala cheia de cópias de seu único conto já publicado. Decidido a se tornar um grande escritor de ficção, ele aluga um quarto mobiliado no hotel Alta Loma.
Ele conhece a beldade mexicana Camilla (Salma Hayek), que é garçonete no Columbia Café, onde Arturo gasta sua última moeda de 5 centavos com uma xícara de café intragável. A atração que surge entre os dois rapidamente encontra sua expressão em gestos de crueldade.
Arturo se compraz em minar a autoconfiança arrogante da garçonete, fazendo-a se envergonhar por não ser uma americana "de verdade". Começa um duelo entre os dois, em que cada um se torna especialista em atingir o outro em seus pontos fracos, o que é fácil de fazer, na medida em que suas inseguranças são quase idênticas.
Tanto Camilla quanto Arturo, filho de italianos, são desprezados por serem estrangeiros, como o roteiro de Towne enfatiza a todo momento.
Towne não parece compreender muito bem o núcleo existencial da história, mas transforma o episódio romântico central do livro em um momento cinematográfico belíssimo: Arturo e Camilla correndo nus, sob o luar, em direção ao mar de Santa Monica, onde seu enlevo rapidamente se transforma em um embate irado.
Colin Farrell consegue transmitir a essência do jovem escritor católico e virgem, que tenta se fazer passar por homem mundano e resiste, assustado, às investidas ousadas da mais experiente Camilla.
Representando uma personagem que é bem mais jovem do que ela, Salma Hayek nunca esteve mais bela, e o espírito tempestuoso de Camilla encontra plena expressão em sua performance.
Mas os jogos de amor e ódio entre eles ficam um pouco cansativos ao longo do filme e não atingem peso emocional. Perdendo-se nos meandros do melodrama, o filme resvala para o sentimentalismo, chegando quase ao ponto de "Love Story".
Há atuações ótimas à margem da narrativa, especialmente o trabalho perfeito de Donald Sutherland no papel do dissoluto vizinho de Arturo, Hellfrick.
Eileen Atkins faz uma ponta como a locatária que discrimina judeus e mexicanos, e Jeremy Crutchley marca presença no papel do barman Solomon. O crítico Richard Schickel faz a voz do jornalista H.L. Mencken, na vida real editor do American Mercury e, no filme, o benfeitor que Arturo vê como semideus.
"Pergunte ao Pó" é um belo retrato da Los Angeles da época da Grande Depressão, um filme que começa forte, mas que perde seu tom noir à medida que avança.