O "teste com o príncipe"
Poucos meses depois de completar 18 anos, J. (nomes e datas não são mencionados para preservar a identidade da depoente) acreditava que sua sonhada carreira como modelo e promotora de eventos ia decolar: havia surgido uma oportunidade de fazer um teste para trabalhar com uma renomada e multinacional rede de supermercados.
A animação deu lugar à decepção quando a jovem estudante foi comunicada de que não tinha sido aprovada. J. afirma que as pessoas responsáveis pelo teste ofereceram uma alternativa, que resultaria em remuneração bastante superior ao emprego original: realizar o que chamavam de "teste com o príncipe". Vinda de outro estado para São Paulo em busca de oportunidades, a estudante aceitou.
O teste, relata, teria sido um encontro na casa de Klein, no qual o empresário lhe fez 22 perguntas, alertando que deveria escolher as respostas corretas. J. narra ter sido induzida, pela primeira vez, a realizar atos sexuais com o filho do fundador das Casas Bahia. Aprovada, afirma ter passado a integrar um grupo de mulheres que viviam na residência de quinta a domingo e seguiam um cronograma estrito e cheio de particularidades.
Klein, por meio de seus advogados, afirma que conhecia as mulheres de diversas formas, mas, principalmente, através de uma agência especializada em recrutar mulheres para empresários com o fetiche "sugar daddy". Ele nega a realização de algum tipo de teste sexual e, diz que quando escolhia mulheres indicadas pela agência, o fazia por fotografias.
"Em termos simples, 'sugar daddy' é o indivíduo que se satisfaz por suprir de maneira habitual e ostensiva as necessidades e os caprichos materiais de mulheres que se apresentam como 'sugar babies'. O contato inicial entre 'daddies' e 'babies' se dá das mais variadas formas: por apresentação de amigos, por indicação de outros participantes desse hábito social, por agenciamento e até mesmo por exposição de perfis em websites especialmente dedicados ao tema", diz a nota da defesa enviada à reportagem.
J. afirma que nunca foi coagida mediante ameaça de violência física a fazer sexo, mas desenvolveu repulsa às relações e sofria pressão psicológica de pessoas encarregadas de comandar o suposto esquema, agravada pelo poder financeiro vultoso de Klein, e seu forte aparato de segurança. A jovem desenvolveu estresse pós-traumático, transtornos alimentares - a reportagem teve acesso a laudos médicos e psiquiátricos que confirmam isso. Ela é uma das mulheres que dizem ter sido vítimas do esquema.
"Sem peito e sem bunda"
O UOL Esporte ouviu ou teve acesso a relatos detalhados de cinco pessoas envolvidas diretamente no esquema, e as narrativas convergem para uma rotina com seis a 30 mulheres ocupando as propriedades de Saul Klein em diversos momentos entre 2008 e 2018, e sendo submetidas a uma série de exigências nada usuais.
O modus operandi de recrutamento do esquema era o mesmo ao qual J. conta ter sido submetida: um teste falso, para uma possível campanha como modelo ou promotora de redes de varejo ou supermercados, com reprovação e proposta do "teste com o príncipe" como alternativa.
Os relatos à reportagem apontam que entre 15 e 20 mulheres eram convocadas à residência do empresário entre quinta-feira e domingo, toda semana. A remuneração pelo período era entre R$ 3 mil e 4 mil reais, com acréscimos por cada dia de permanência a mais.
Durante a estadia, era obrigatório que todas se apresentassem pontualmente para as três refeições e vestissem roupas sensuais determinadas pelo anfitrião - uso de minissaias era requisitado. A orientação era para que se referissem a Klein por termos como "príncipe", "amor" ou o apelido "Zinho".
As mulheres eram pressionadas a se enquadrarem em um perfil cultural, fazendo aulas de balé, canto, lendo determinados livros escolhidos pelo empresário, assistindo aos vários DVDs piratas e encenando ou debatendo depois com Klein.
A ordem era para que houvesse controle rígido do peso e submissão a uma série de tratamentos estéticos e médicos, que variavam de idas ao salão de beleza a intervenções com cirurgião plástico, sempre realizadas em uma das propriedades do empresário. O biótipo preferido era de mulheres magras e jovem, "sem peito e sem bunda", na descrição de uma das mulheres que denuncia o esquema.
A defesa de Klein afirma que as práticas são naturais nas relações "sugar daddy" e que os procedimentos eram presentes, parte do fetiche. "Nesse campo de exercício regular de direito, o Sr. Saul Klein por anos celebrou festas periódicas das quais participaram diversas mulheres com as quais mantinha laços 'daddy-baby'. O maior deleite do Sr. Saul Klein nesses encontros vinha da interação pura e simples com moças interessantes e bonitas - conversas, jogos, danças, leituras, compartilhamento de experiências ligadas à arte e à gastronomia etc. Essa era a fantasia dele: estar cercado de mulheres agradáveis, com quem pudesse livremente passar horas de prazer mental e físico", diz.
À noite, a rotina dava lugar a festas, que tinham no anfitrião o único participante do sexo masculino, das quais as mulheres participavam obrigatoriamente em trajes de banho ou nuas, e eram estimuladas a manterem relações sexuais entre si. Algumas eram selecionadas para a prática de atos sexuais com o empresário - havia um rol de preferidas que eram escolhidas com frequência, sempre mais de uma. Relatos de mulheres que frequentavam a residência de Klein dizem que ele tinha predileção por sexo anal, se incomodava com qualquer expressão de dor e realizava todos os atos sem a utilização de preservativo.
À reportagem, as mulheres não citaram ameaças ou emprego de violência física para forçá-las a atos sexuais. Os relatos são de pressão psicológica feita por encarregados de manter o suposto esquema, lembrando os valores já gastos pelo empresário com as garotas e avisando a quem se recusasse que teria que deixar o local e nunca mais retornar - a essa altura, várias das mulheres eram financeiramente dependentes da situação. Essas conversas, por vezes, aconteciam em meio a presença de seguranças.
Os advogados do empresário não negam que tenha havido relações sexuais, mas afirmam que elas nem sempre ocorriam e, sempre que existiram, foram consensuais.
Nessas festas poderiam, ou não, ocorrer relações sexuais, sendo comum que tais eventos se esgotassem apenas em divertimento não-sexual. Quando ocorreram, porém, foram absolutamente consensuais, afinal, os participantes eram maiores, desimpedidos, e estavam ali de livre e espontânea vontade - e, saliente-se, todas queriam voltar aos eventos, em franca demonstração de que estavam de acordo com o que ali acontecia.
Em alguns finais de semana, as festas eram transportadas para um luxuoso sítio no interior de São Paulo, apelidado de "o Spa" pelas mulheres. Ali, o número de garotas dobrava, e cerca de 30 participavam dos eventos. O uso de telefones celulares ou qualquer tipo de contato com terceiros no mundo exterior era, segundo as mulheres, estritamente proibido (o empresário contesta essa versão). De segunda a quarta, apenas cinco ou seis mulheres permaneciam nas propriedades de Klein.
Pois é...dinheiro atraí mulheres lindas e gostosas,mas por outro lado quando elas resolvem se vingar....