– À entrada na prostituição
Se nos centrarmos agora no momento de entrada na prostituição, todos partilham uma característica: o desejo de ganhar dinheiro, de forma mais rápida e em maior quantidade. A antecipação de que poderão atingir este objetivo com o sexo comercial é-lhes, frequentemente, sugerida por amigas, conhecidas, vizinhas ou colegas com experiência na prostituição, que as ajudaram a perceber as vantagens, dando com isso um contributo para a sua decisão de iniciarem a atividade. Num momento de dúvida sobre o rumo a dar à sua vida e na presença de dificuldades económicas, cerca de metade das mulheres a quem realizei entrevistas aprofundadas refere esta influência. Fosse porque uma mulher com quem se relacionavam lhes salientou o aspeto mais positivo do trabalho sexual, dinheiro rápido e em quantidade como solução para os seus problemas, fosse porque ao observarem a forma como essa pessoa vivia puderam perceber a alta rentabilidade do negócio. Veja-se, a este propósito, o seguinte exemplo:
– É assim: eu na altura separei-me, tinha um filho, eu tenho um filho de 12 anos, separei-me e tinha uma amiga que trabalhava na vida
(
) E então as pessoas diziam
tinha pessoas amigas que diziam: «Ai, esta vida é fácil, vou para uma boîte e tal. O quê? Trabalhas todo o mês para receber 60 contos?»
– Onde é que a Clara trabalhava?
– Num restaurante. E eu num dia fui, experimentei e, só num dia, fiz 70 contos. No primeiro dia fiz 70 contos. (
) comecei a pensar: vou trabalhar todo o mês para ganhar 60, se eu num dia posso ganhar 70? (Clara, 27 anos, portuguesa)
No que concerne às influências exercidas por terceiros na entrada na prostituição, existe um estereótipo que é infirmado neste trabalho: o de que as mulheres entram na prostituição sempre pela influência nefasta de um explorador. Apenas três das mulheres entrevistadas referem a interferência decisiva de um namorado aquando do início da sua atividade, não tendo sido relatada, em nenhum dos casos, a existência de coação, mas sim de persuasão. A influência de outras trabalhadoras do sexo suas conhecidas parece mais evidente do que a influência de um homem com objetivos de exploração.
Outra regularidade consiste na passagem pelo alterne ou pela prostituição de interior, em bares ou em apartamentos, antes do ingresso na prostituição de rua. Metade das trabalhadoras do sexo que entrevistei trabalhou em contextos de interior antes de se decidir pela prostituição de rua. Esta passagem por outros tipos de trabalhos sexuais, com posterior opção pela rua, dá-se pelo reconhecimento das vantagens deste tipo de prostituição, nomeadamente pela probabilidade de fazerem mais dinheiro por não terem que repartir lucros, pela liberdade de horários e dias de trabalho e pelo facto das relações sexuais serem habitualmente rápidas e desprovidas de afeto, e não por degradação pessoal ou despromoção na carreira.
A Sónia (30 anos, portuguesa), por exemplo, começou a fazer alterne por sugestão duma vizinha sua que o praticava e, mais tarde, passou para a prostituição de rua.
Entretanto a vida complicou-se: pagava 12,5 euros por dia na pensão e sentia dificuldades em fazer face às suas despesas porque só fazia alterne. Uma das pessoas que morava na pensão era prostituta e dizia-lhe quanto ganhava: «foda-se e eu estou ali e não faço nada
», pensava. Além disso, não gostava de ter que ser apalpada para poder fazer algum dinheiro. Diz que o sistema do alterne não dá com o seu feitio (
). Perguntou ao Sílvio [o namorado] o que é que ele achava e ele disse-lhe que não achava bem. Face a esta oposição, ela esperou mais uns dias, mas depois decidiu-se a ir. Na primeira noite, entre as 22.30h e as 2h fez 80 contos. Foi ter com o Sílvio, que saía às duas e meia, e mostrou-lhe o que tinha ganho. «Comecei e aí estou
»
Quanto aos aspetos singulares: há mulheres que entraram no trabalho sexual com pouca idade, entre os 16 e os 20 anos, mas outras que o fizeram mais tarde, depois de terem passado por um casamento e quando já têm filhos; algumas ingressaram na prostituição porque estavam desempregadas, outras desempregaram- se para entrar na prostituição; ainda outras nunca tiveram um emprego sem ser na área do trabalho sexual. A maior parte tem filhos e marido, companheiro ou namorado, com quem formam uma família, mas nem todas preenchem estas duas características. Certas, por exemplo, moram sós, em pensões.
Pontos de inflexão e mudança
Quando se analisam os percursos individuais das prostitutas, tomando em consideração as variáveis contextuais, familiares e sociais que caracterizam tanto o seu passado como o momento presente, os recursos psicológicos, económicos, escolares e profissionais que possuem e a altura da vida em que se encontram, percebe-se que houve uma rutura que implicou uma modificação na sua trajetória. Esta noção de rutura ou inflexão na trajetória de vida destas mulheres e transgénero, quando iniciam o trabalho sexual, parece-nos importante para a compreensão da sua entrada no comércio do sexo. O ingresso no trabalho sexual faz-se através dum processo de corte num momento crítico ou com um passado problemático que rejeitam.
As circunstâncias que estão subjacentes a esse processo são variadas, mas observámos duas formas que surgem com mais frequência: a presença dum acontecimento marcante que provoca alterações drásticas na vida da pessoa e a fuga à violência familiar.
A presença dum acontecimento marcante que provoca alterações drásticas na vida da pessoa é observada em várias das histórias de mulheres e transgéneros. Trata-se duma ocorrência relevante, como o divórcio, a prisão do cônjuge, a expulsão de casa pelos familiares ou a perda do emprego – acontecimentos de vida importantes que obrigam a mudanças profundas na existência individual. Nestas situações, muitas delas vêm as suas necessidades financeiras aumentar exponencialmente, pois ficam sozinhas com os filhos a seu cargo, não podem dividir despesas, passam a ter que pagar uma renda de casa, podendo igualmente haver uma diminuição repentina dos seus rendimentos. Face a estas circunstâncias, o trabalho sexual surge como uma opção válida, no qual elas poderão auferir a quantia de dinheiro de que necessitam. Mostrei já um exemplo, o da Clara (27 anos, portuguesa), em que esta situação surge evidente: ela refere o pós-divórcio e a existência do filho, aos quais se pode associar a influência do grupo de amigas, como tendo sido decisivos para a sua entrada na prostituição.
A outra circunstância que aparece com frequência relevante é a fuga à violência familiar continuada. Esta motivação, presente em muitas das histórias de vida, está associada quer à violência conjugal, quer à violência parental. Assim, existem mulheres que ingressaram na prostituição na sequência da fuga dum casamento no qual eram vítimas de violência por parte do marido. Por exemplo, a Joana (44 anos, portuguesa) fugiu de um marido agressor com a filha menor. Ela exercia a sua profissão com ele, pelo que, após a fuga, ficou sem meios de subsistência. Começou a procurar emprego tendo respondido a um anúncio para trabalhar numa pensão, sem ter percebido do que se tratava. Uma vez lá e perante a oferta de trabalhar como prostituta, começou por recusar, mas acabou por ceder e entrou no trabalho sexual.
Noutros casos, raparigas bastante jovens fogem ao seu meio familiar por serem vítimas de agressões físicas, psicológicas ou sexuais, por assistirem a maus-tratos conjugais ou por desejarem escapar à rigidez e desadequação das normas impostas pelos progenitores9. Em algumas destas situações, as raparigas ficam sozinhas e, sem outras formas de sustento, a prostituição pode, então, aparecer como a alternativa mais realista para poderem sobreviver. Para algumas, o ingresso na prostituição faz-se de forma progressiva. Elas começam por mendigar ou aceitar que lhes ofereçam algo e, logo, alguns homens mais velhos trocam essas ofertas por pequenas permissões de carácter sexual. Depois disto, acabam por se envolver em práticas de prostituição.
Estas duas formas de entrar no trabalho sexual, a que decorre de um acontecimento drástico e a que ocorre por fuga à violência, são os percursos de entrada na prostituição que surgiram mais frequentemente nas trajetórias que estudei, embora não esgotem a totalidade das situações.
Para terminar, resta reiterar que as trajetórias de entrada no trabalho sexual de rua são todas diversificadas sendo caracterizadas quer por particularidades individuais, quer por pontos que podem ser comuns a várias delas.
Notas finais
As perspetivas feministas relativas à prostituição têm, ao longo do tempo, passado por mudanças, sendo que, atualmente, a abordagem vitimizante, aquela que mais fortemente é associada com «o» feminismo, encontra-se a par de uma outra visão sobre a prostituição que encara esta como uma opção e um trabalho. Ainda assim, mesmo esta corrente deve estar vigilante sobre as formas que a sua conceção pode tomar para que, ao tentar fugir de uma visão simplista, o determinismo abolicionista, não caia numa outra abordagem simplista, aquela que glorifica o trabalho sexual, esquecendo que nem sempre este é vivido e percecionado de forma positiva.
De qualquer forma, quaisquer leituras feministas que possam ser efetuadas serão sempre parciais, pois partem da realidade social e política que as enquadra, tal como cada prostituta terá a sua própria subjetividade (Pinto et al., 2010). Porém, se assumirmos a tradição interpretativa da conceção construtivista da ciência (Denzin, 1998), reconhecendo que a interpretação assenta no conhecimento de dentro e que os objetos da sua análise são as experiências vividas pelas pessoas (Charmaz, 1995), esta dualidade entre perspetivas feministas e subjetividades das prostitutas deixa de ter lugar. Aliás, como referem Pedro Pinto et al. (2010), é preciso ouvir as vozes das prostitutas e aquilo que elas nos contam para lá das cegueiras ideológicas, considerando a subjetiva especificidade das múltiplas experiências. Até porque os conhecimentos científicos e empíricos têm mostrado isso mesmo, que a realidade do comércio do sexo é multifacetada e as motivações, experiências e significados dos/as trabalhadores/as do sexo são diversificados.
Ouvir as vozes de quem faz prostituição afigura-se como uma aplicação do que aqui enunciamos e resolve, a nosso ver, parte da contenda ideológica. Tomar a perspectiva de quem faz prostituição de rua foi o que fizemos no trabalho de que agora apresentamos uma parte. Apesar de se tratar de uma investigação sobre um pequeno segmento do comércio do sexo, aquele que se pratica na rua, o que, à partida, reduz já o leque de características e experiências pessoais, as trajetórias dos/as trabalhadores/as do sexo que encontrámos mostraram ser diferentes entre si. Os percursos das pessoas que se prostituem são diversos e não são lineares, nem pré-determinados por qualquer destino ou especificidade.
A maioria dos comportamentos humanos são complexos e este, em particular, pelas suas características e implicações, é-o de sobremaneira, pelo que deve ser apreendido de forma complexa. Só poderemos compreender a prostituição na articulação da multicausalidade (tendo em conta variáveis de diversa ordem – psicológicas, sociais, culturais, económicas, de género), na apreensão dos processos e na análise dos sentidos e significações que o sujeito atribui aos seus atos e às suas inter-relações; sem grelhas ideológicas que espartilhem as múltiplas realidades e experiências, mas partindo dessa mesma realidade para fundamentar as nossas interpretações.
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Artigo recebido em 15 de fevereiro de 2013 e aceite para publicação em 25 de junho de 2013.
Notas
1 Professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. É doutorada com uma tese sobre prostituição de rua e os seus interesses de investigação relacionam-se com o género, a sexualidade e a norma, o desvio e a reação social. O último livro que editou «Andar na vida: prostituição de rua e reacção social» (Almedina, 2011) é o resultado da adaptação da sua tese de doutoramento, defendida em 2008.
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, Rua Alfredo Allen, 4200-135 Porto.
[email protected]
2 Não é, nem foi, no entanto, propósito deste trabalho discutir estes. A nossa investigação reclama-se duma abordagem fenomenológica, especificamente das teorias do ator social que se ligam com a análise do vivido e do percurso individual. Interessou-nos, assim, os sentidos e significados que as prostitutas atribuem aos seus atos e às suas trajetórias, muito embora situando-as num contexto e numa história específicas.
3 Optámos por centrar esta discussão nestas duas grandes visões, por serem as que têm dominado o debate feminista sobre a prostituição. Fizemo-lo porque, na ausência de espaço bastante para efetuar uma discussão mais aprofundada, estas duas perspetivas nos pareceram suficientemente esclarecedoras da forma como este debate tem sido polarizado. Para um melhor aprofundamento das perspetivas feministas sobre a prostituição, referenciamos o texto de Pinto et al. (2010), em Portugal, ou o livro de ONeill (2001).
4 Na verdade, os objetivos deste trabalho foram mais latos, incluindo outros aspetos relacionados com as/os trabalhadoras/es do sexo, mas também com os clientes da prostituição, os contextos das atividades prostitutivas, bem como o próprio exercício da venda de sexo e as interações que aí ocorrem entre os/as diversos/as atores/atrizes; e, mais, a reação social aos/às atores/atrizes e atos do sexo comercial de rua, seja por parte de indivíduos ou grupos, seja por parte de instituições. Porém, destes, não daremos conta neste artigo.
5 Embora tenhamos definido as unidades de observação como sendo zonas de prostituição urbana no centro da cidade do Porto, existem outros territórios da prostituição de rua, designadamente aqueles junto a bairros de habitação social, matas, parques e vias rápidas na periferia da cidade ou em localidades limítrofes, nos quais as/os prostitutas/os não recorrem a pensões desempenhando o seu trabalho ao ar livre, nas viaturas dos clientes e em edifícios abandonados ou que têm outras funções. Ainda algumas das pessoas que se prostituem na rua, seja no centro da urbe ou nas periferias, desloca-se a outro tipo de estabelecimentos hoteleiros que não são as pensões, como os hotéis ou, mesmo, vão a casa dos clientes.
6 À medida que fomos conhecendo as/os prostitutas/os, criámos ficheiros individuais, aos quais demos o nome do/a respetivo/a trabalhador/a do sexo e, aí, íamos incluindo as informações que obtínhamos. Embora não o tenhamos efetuado para todas as pessoas que conhecemos no decurso do nosso trabalho de terreno, no fim acabámos por contabilizar 108 destas fichas, sendo umas mais relevantes do que outras, de acordo com a quantidade e pertinência das informações que contêm.
7 As entrevistas informais referem-se a conversas – conversas com um propósito, como formula Burgess (1984) – que desenvolvemos com todo o tipo de informantes, fosse porque apareciam espontaneamente, fosse porque as induzíamos mas, em qualquer um dos casos, estas surgiam naturalmente no decorrer das interações desenvolvidas no terreno.
8 Esta parte do trabalho que traça as trajetórias de vida baseia-se predominantemente nos dados obtidos através das entrevistas aprofundadas, uma vez que esta análise exige a introdução de uma dimensão temporal que não é captável pela observação. Contudo, os dados que apresentamos e as análises que efetuamos nesta secção são indissociáveis da informação proveniente da observação. Aliás, é esta a lógica dum trabalho etnográfico, em que a observação é apenas a estratégia central.
9 Estes casos, que têm baixa representatividade entre as mulheres que participaram no nosso estudo, podem ser enquadrados no fenómeno das crianças ou adolescentes fugitivos que tem sido descrito pela literatura estrangeira sob a designação de runway adolescents ou runway children e que tem sido associado à prostituição (e.g. Cusick, 2002; Rees & Lee, 2005; Flowers, 1998; ONeill, 2001).
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