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ASSUNTOS INTERNACIONAIS
Uma superpotência astuta
Com muito charme e manha, ligado com os Estados Unidos, e próximo de Obama, Lula está construindo um gigante regional único.
Por Mac Margolis | Newsweek
Publicado em 18 de abril de 2009
Da edição da revista de 27. De abril de 2009
[sob foto do Lula]
Globe-Trotter: O brasileiro Lula está levantando o perfil de seu país, “fazendo rodadas” com líderes estrangeiros.
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva está em um papel.
Nas últimas semanas ele tem compartilhado uma posição de desataque com Gordon Brown e Nicolas Sarkozy, e atraído elogios efusivos ( "O meu homem!") de Barack Obama no Econtro do G20, em Londres. Ele até tirou uma foto oficial com a rainha Elizabeth II.
O ex-metalúrgico, que passou décadas combatendo o "capitalismo selvagem", é agora brindado pelos banqueiros e acionistas. "Você não acha que é chique, que agora estamos emprestando dinheiro ao FMI?" brincou ele em uma conferência de imprensa.
Não faz muito tempo, essas cenas teriam sido improváveis. Com a democracia brasileira recém adquirida, crescente pobreza e um economia propensa a acidentes, os líderes do país eram mais suscetíveis a pedirem ajuda do que a ficar ombro a ombro com os mandachuvas do palco internacional.
Após décadas de passos em falso, o Brasil tornou-se uma democracia sólida de livre-mercado, uma rara ilha de estabilidade em uma região de turbulência, e regido pelo Estado de Direito, em vez dos caprichos dos autocratas. Agora o Brasil está se afirmando como nunca antes, mas de uma forma que é nitidamente diferente dos outros grandes jogadores globais.
Ao longo da última década, o Brasil tem emergido como uma potência regional única. Apoiando-se na cobertura do guarda-chuva da segurança norte-americana, e num hemisfério sem reais inimigos, o Brasil tem liberdade para alavancar a vantagem de sua vasta dimensão econômica dentro da América do Sul para ajudar, influenciar ou cooptar vizinhos, enquanto contém o seu rival regional mais problemático, a Venezuela.
Lula preside uma superpotência astuta diversa de qualquer outro gigante emergente. A política chinesa a firmeza de Taiwan, e a esfera de influência soviética no Cáucaso que Moscou nunca abandonou. As obrigações de segurança da Índia, da fronteira paquistanesa até o Golfo Pérsico, e a longa sombra que Washington lança de pólo a pólo. Ainda assim o Brasil tem afirmado as suas ambições internacionais sem agitar um sabre.
Quando apaga chamas entre vizinhos - como quando o Equador e o Peru quase foram para a guerra, na década de 1990, e após a Colômbia bombardear acampamentos guerrilheiros na selva equatoriana no ano passado - diplomatas e advogados são despachados para as zonas de conflito ao invés de uma frota ou tanques. E quando as forças de paz da ONU entraram em conflito com gangues de rua no Haiti, os brasileiros apelaram não para um aumento das tropas, mas para os jogadores de futebol Ronaldinho, Robinho e Ronaldo, que jogaram um amistoso na zona de guerra.
Agora jovens haitianos batalham com chuteiras, não Kalashnikovs.
Os brasileiros também se tornaram uma voz mais firme para os mercados emergentes nos assuntos internacionais. Eles mobilizaram as maiores nações em desenvolvimento a desafiar os subsídios agrícolas das nações ricas do mundo, formando um grupo que é hoje conhecido como o G5.
Com o estímulo de Brasília, os embaixadores do Brasil, China, Índia e Rússia agora se reunem mensalmente em Washington para coordenar uma estratégia política comum do BRIC, muitas vezes contrariarando posições dos Estados Unidos.
Empurrando a sua agenda "sul para o sul", o governo Lula abriu 35 embaixadas desde que tomou posse em 2003, a maioria delas na África e no Caribe. O Brasil também lidera uma missão de paz amplamente aclamada no Haiti, um dos maiores casos do hemisfério.
O Brasil pode fazer tudo isto em grande parte porque não tem nenhum real estado inimigo com o qual brigar, e é, portanto, separado das de muitas das responsabilidades do poder, como o patrulhamento das rotas marítimas.
Além disso, os Estados Unidos tem sido sempre o último recurso de paz na região, por isso, enquanto os países emergentes em muitas zonas problemas globais devem usar preciosa riqueza em defesa, as despesas militares do Brasil têm permanecido estagnadas em cerca de 1,5 por cento do PIB, um quarto das despesas em defesa da China e cerca de 60 por cento das da Índia e da Rússia.
"O Brasil não tem a ambição de ser uma potência militar", diz Amaury de Souza, um analista político brasileiro. "O que temos é força econômica, uma história de defesa dos nossos interesses e de uma cultura complexa e atraente."
Durante anos os brasileiros quiseram ter um papel mais importante nos assuntos mundiais, e o mundo recusou. Apesar dos seus esforços guerra – o Brasil foi o único país latino a enviar tropas para a Europa durante a Segunda Guerra Mundial – o país não teve um assento à mesa de negociação pós-guerra.
A posição Internacional do Brasil finalmente ganhou um upgrade em meados da década de 1990, quando a administração de espírito reformista de Fernando Henrique Cardoso parou a inflação, abriu o país para o comércio e normalizou as relações esfarrapadas com a comunidade financeira mundial.
"Cardoso aproveitou a nova boa vontade em relação à jovem democracia para obter um papel mais assertivo no estrangeiro. Ele argumentou a favor de um assento no Conselho de Segurança da ONU, deu início a uma zona de livre comércio para a América do Sul, o Mercosul, e reuniu as maiores nações em desenvolvimento sob a bandeira do livre comércio.
Mas nenhum governo foi tão determinado como o de Lula em estender o alcance internacional do Brasil.
Embora ele tenha começado sua carreira política na esquerda, Lula surpreendeu os investidores estrangeiros e nacionais ao preservar as políticas amigáveis ao mercado de Cardoso, para a grande frustração dos militantes do seu Partido dos Trabalhadores e aliados. Para a esquerda, ele ofereceu uma um política externa vitaminada.
"Lula colocou esteróides na política externa de Cardoso", diz Donna Hrinak, ex-embaixadora dos EEUU em vários países latinos.
Lula duplicou o número de departamentos do Ministério do Exterior e embarcou em um itinerário internacional de tirar o fôlego, visitando 45 países e gastando quase um em cada cinco meses no cargo no estrangeiro, apenas desde 2007. "Aero-Lula", foi o apelido dado pela imprensa local. (uma clara má interpretação do articulista americano, que entendeu que o apelido era para o Lula e não para o avião usado por ele)
O propósito explícito de toda esta diplomacia tem sido reforçar as relações com outros países em desenvolvimento. Mas a visibilidade maior de Lula tem também ajudado a forçar a nações ricas a reduzir as barreiras comerciais. Nos dois principais casos, em 2004 a OMC decidiu a favor do Brasil, ordenando os EEUU a derrubar subsídios aos agricultores de algodão, e disse a Europa para pôr fim à sua proteção da indústria de açúcar da beterraba.
Mantendo o firme apoio de Lula para o comércio livre, o Brasil também ficou ao lado dos EEUU na recente rodada de Doha de negociações comerciais, sobre as própria barreiras protecionistas do mundo em desenvolvimento. Em um recente relatório de alerta para aumento do protecionismo dos países em desenvolvimento, o Banco Mundial elogiou brasileiros por resistir às pressões de fechar as suas próprias fronteiras.
Pelo menos uma parte desses esforços provém da estratégia não-declarada do Brasil de se contrapor à influência dos Estados Unidos na região e dissipar as expectativas de que exerça um papel representante de Washington.
De fato, enquanto os funcionários dos Estados Unidos polem a diplomacia com seu novo "parceiro global", Brasília tem sido muito silenciosa enquanto o homem forte venezuelano Hugo Chávez ameaça empresas estrangeiras, intimida a oposição e dá uma de valentão com seus tribunais e Congresso.
"Ninguém pode alegar que não existe democracia na Venezuela" é a defesa padrão de Lula para seu “companheiro” Chávez.
Citando a regra da soberania, o Brasil também condenou firmemente Colômbia, o mais próximo aliado dos EEUU na região, por atacar um acampamento guerrilheiro na selva equatoriana no ano passado, e rotineiramente se abstém em resoluções da ONU condenando as violações de direitos humanos em Cuba.
Mas Lula dificilmente tem se jogado na revolução bolivariana. Em vez disso, ele tem controlado a região cooptando seus vizinhos com o comércio, transformando todo o continente em um mercado cativo para produtos brasileiros. Em última análise, o poder do Brasil não decorre das armas, mas de sua imensa reserva de recursos naturais, incluindo petróleo e gás, metais, soja e carne, e tornou-se um dos principais fornecedores dos mercados na Ásia e mais perto de casa. O Brasil goza agora um superávit comercial com todos os países da região, incluindo um excedente de $1 bilhão com a Venezuela.
"Transformar os recursos naturais em bens de valor agregado tem ajudado o Brasil a dar socos acima seu peso", diz David Rothkopf, um antigo oficial do Departamento de Comércio dos Estados Unidos.
Por exemplo, Lula tem reprimido duas grandiosas iniciativas do livrinho de Chávez, um banco regional de desenvolvimento (Banco del Sur) e uma refinaria de petróleo conjunta Brasil-Venezuela, contornando isso silenciosamente nunca alocando de verbas para ajudar.
Ele também criticou Chávez por seus enormes gastos em armas modernas mesmo a economia da Venezuela sendo tão fraca que se tornou extremamente dependente do Brasil para suprir bens de consumo básicos.
"Cristo, pra que você quer essas armas?" Foi visto Lula dizendo a Chávez em uma recente visita. "Você não pode sequer providenciar seu leite para o café em seus hotéis."
O Congresso do Brasil provavelmente vai acabam aprovando a entrada da Venezuela no Mercosul nas próximas semanas, e não como um endosso aos desejos imperiais de Chávez, mas como uma forma de contê-lo através das obrigações do tratado do bloco comercial, tais como o respeito à democracia e à proteção à propriedade.
Isso pode ser política de risco. Mas as apostas estão nos brasileiros. Sem um manual de como se tornar uma potência mundial, o Brasil de Lula parece estar escrevendo o seu próprio.