Naquele ano, a véspera de Natal caiu num dia particularmente quente de outubro. Foi um alívio quando, depois que a patroa e os pirralhos entraram na sala de embarque, ele pôde finalmente dar um break e tomar uma geladinha, ali mesmo no saguão do aeroporto.
O ano inteiro havia esperado por essa data. A mulher e os filhos viajando para visitar os parentes no interior de Goiás, ele ficando na cidade, muito serviço pra terminar, sabe como é, nesta época do ano ninguém quer saber de trabalhar, sobra tudo pra eu fazer, meu chefe é gordo, etc. etc., vocês precisarão ir sem mim, meu bem, mas no ano que vem não perco a confraternização da sua família, divertidíssima, etc. etc. etc., boa viagem, me liga, meu amor, beijo, tchau, meninos, aproveitem, affff, enfim estou livre, alvará no capricho para a melhor foda do ano, eu mereço, pagou a conta e voltou correndo pra casa para consultar a wish list.
Estava com tanta pressa que nem fechou a porta da sala, já entrou e foi correndo pros fundos do apê, onde ficava o seu pequeno escritório, tinha deixado o computador ligado pra não perder nem um segundinho.
Algumas opções selecionadas a partir das consultas aos sites de fotos e aos foruns de putaria: as melhores, as mais promissoras, as mais suculentas pervas deixadas para aquela ocasião, quando poderiam ser degustadas com mais calma. Primeira da lista, Paola Grossi, gostooooooosa, vamos ligando, vamos ligando, vamos ligando, ué, onde foi que eu deixei meu celular?
"Procurando por isto, colega?", perguntou uma voz grave, trêmula, sinistra, decididamente fantasmagórica. Uma nuvem esbranquiçada esvoaçava à sua direita, e as luzinhas do celular piscavam no meio dela.
- Quem é você? Sai pra lá, assombração. Hoje é Natal, não Halloween. Desencosta, rapá.
"Calma, amigo. Sou um fantasma do bem. Seu anjo da guarda, se você prefere acreditar em outro tipo de fantasma. Vim te fazer um favor. Você já conhece essa tal Paola Grossi?
- Não, não conheço, vou desbravar. Pelas fotos, é um espetáculo, um monumento, uma verdadeira lowcura...
"Gostaria de vê-la pessoalmente antes de marcar o TD? Podemos fazer-lhe uma visitinha, coisa rápida, vamos voando e não pegamos trânsito."
- Voando? Essas historinhas do Tricampeão estão cada dia mais viajadas...
"É verdade, se fosse uma crônica do Fortimbrás ou do Nazrudin, a uma hora dessas estaríamos na fila do busão, mas o Tricampeão é um escritor moderno, com preocupações sociais, não explora seus personagens, preocupa-se em garantir-lhes as melhores e mais humanas condições de trabalho, embarquemos neste mágico tapete voador, que tem até ar condicionado, olha só, vrrrrummmmmm, vrrrrrummmmm, que arzinho bão, sobe aí e vamos dar um rolê, companheiro."
Não tinha como recusar essa oferta. Sentou no tapete e voaram na direção de Moema.
"Vamos passar por alguns lugares que você conhece. Por exemplo, lembra-se daquele flat ali, onde moram diversas GPs? Já teve umas experiências ruins lá, hein?"
- Nem me fale, é aí que mora a Daniella Strupicelly, a pior foda da minha vida. Não beija, não chupa, não mete, não sorri, não conversa, mais sem graça que comer esfiha de abobrinha em comício do PMDB. Dinheiro jogado fora.
"Mas você não postou o TD, postou?"
- Não postei porque não queria zoação pro meu lado daqueles caras do forum, já pensou, gastei trezentas pilas com aquela baranga.
"Fez mal, companheiro, a Strupicelly e sua companheira de quarto, a Dragony Cagnon, faturaram bastante com a picaretagem, e agora têm uma concessionária de automóveis, uma construtora e uma fábrica de helicópteros."
Não respondeu. Agora sobrevoavam uma favela, e o fantasma voltou a falar:
"Naquela favela ali mora a Raimunda Pocotó, lembra-se dela?"
- Hummmmm, é claro que me lembro. Não era nenhuma princesa, mas metia pra caralho. Minha melhor foda, sem dúvida. Pena que sumiu e não consegui mais achá-la.
"Pois é, a Raimunda quebrou, ficou sem clientes porque suas fotos no site eram verdadeiras. A coitada não tinha referências nos foruns de putaria, já que ninguém postou os TDs que fez com ela."
- Eu não postei pra galera não me chamar de BOP... e também porque eu não queria que muita gente comesse... um pouco de exclusividade é bom, né? Senão fica parecendo puta de beira de estrada, que todo mundo come, é claro que você entende...
"Bem, agora realmente ninguém vai comer. Engordou, despencou, cortou o cabelo pra por aplique, está pensando em voltar a atender, mas desta vez vai ter que abusar do photoshop."
- Talvez eu tenha errado em sonegar os TDs. Mas é que às vezes não tenho vontade de escrever, sabe, falta de prática...
"Chegamos, veja. Lá está a Paola. E com um cliente."
- Ué, mas aquele parece comigo. Parece não, sou eu! O que está acontecendo?
"Todos tapetes voadores homologados para figurar nas crônicas do Tricampeão podem mover-se tanto no tempo quanto no espaço. Pensei que você acharia legal espiar um pouquinho no futuro."
- Não estou vendo a Paola, estou vendo é três homens mal encarados conversando comigo.
"Paola Grossi é nome de guerra de Toríbio Largonne, o travesti mais barra pesada de São Paulo. Os outros dois são capangas dele. Usam fotos falsas para atrair os otários e assaltá-los no seu flat."
- Caralho, um traveco operado com tanto tempo de praça, vejo essas fotos dela no site há quase um ano, ninguém denunciou não?
"Você não é o único que sonega TDs, meu caro. Muitos tiveram vergonha de postar uma Pisada na Bola dizendo que foram enganados por fotos falsas. E o Toríbio não foi operado, nem pretende ser. Quando a vítima aceita de boa pagar um boquete, ele libera o cara depois de uma mera gozada na boca, mas quem resiste, como você está fazendo, ele esmerilha o cu sem dó."
- Você só pode estar brincando, eu não estou lá, estou aqui em cima, no tapete voador junto com você, cadê você, branquelão? não me deixe aqui, sai pra lá, tira a mão da minha bunda, ô folgado, me solta, merda, para de balançar o prédio, que eu fico tonto, acende a luz, ai, minha cabeça...
Quando acordou, o flat de Paola Grossi, aliás Toríbio Largonne, havia sumido. A mobília era a do seu próprio apartamento. A luz estava acesa. Dois dos facínoras tinham ido embora, mas o maldito traveco ainda estava sentado ao seu lado, virado de costas. Pegou um vaso em cima da mesa da sala pra mandar ver na cabeça do fidaputa, o vaso era presente da sogra, melhor ainda, mas, quando tentou se levantar, a cabeça parecia de chumbo, soltou um suspiro e deitou-se novamente.
- Cara, você me deu um soco na boca, seu maluco. É assim que me agradece? Se não fosse eu, você já era.
- Quem?!?
- Sou eu, o Ademar, seu cunhado, porra, não me reconhece? Vim pedir pra me emprestar o apê do Guarujá, como faço todos os anos, te achei aí caído no chão, um fedor de gás da porra, te sacudi e você começou a gritar e a me bater, tá louco, caralho?
Tossiu. Respirou fundo. A névoa começou a se dissipar. Havia esquecido o gás aberto ao sair de casa, quando voltou deve ter dado alguns passos na direção do escritório, na pressa nem prestou atenção em cheiro de porra nenhuma, desmaiou, sonhou, arghh, que sonho terrível, o Tricampeão pegou pesado agora, que foi que eu fiz, já sei, foi o que eu não fiz, mas aprendi a lição, me deixa fora das suas histórias daqui pra frente ok?
No mesmo dia, começou a botar os TDs em dia. Ainda sobrou tempo pra desbravar uma puta, não a Paola Grossi, cê besta sô, foi uma tal de Perla Tamagoshi, uma merda, japonesa paraguaia, mas postou o TD, e desde aquele dia, nunca mais sonegou, sempre postava religiosamente, se dava bem, postava, se dava mal, postava, se dava mais ou menos postava, a puta dava bolo postava, brochava postava, e foi assim que, depois de menos de 6 anos, atingiu a histórica marca de mil TDs.
Trica
O ano inteiro havia esperado por essa data. A mulher e os filhos viajando para visitar os parentes no interior de Goiás, ele ficando na cidade, muito serviço pra terminar, sabe como é, nesta época do ano ninguém quer saber de trabalhar, sobra tudo pra eu fazer, meu chefe é gordo, etc. etc., vocês precisarão ir sem mim, meu bem, mas no ano que vem não perco a confraternização da sua família, divertidíssima, etc. etc. etc., boa viagem, me liga, meu amor, beijo, tchau, meninos, aproveitem, affff, enfim estou livre, alvará no capricho para a melhor foda do ano, eu mereço, pagou a conta e voltou correndo pra casa para consultar a wish list.
Estava com tanta pressa que nem fechou a porta da sala, já entrou e foi correndo pros fundos do apê, onde ficava o seu pequeno escritório, tinha deixado o computador ligado pra não perder nem um segundinho.
Algumas opções selecionadas a partir das consultas aos sites de fotos e aos foruns de putaria: as melhores, as mais promissoras, as mais suculentas pervas deixadas para aquela ocasião, quando poderiam ser degustadas com mais calma. Primeira da lista, Paola Grossi, gostooooooosa, vamos ligando, vamos ligando, vamos ligando, ué, onde foi que eu deixei meu celular?
"Procurando por isto, colega?", perguntou uma voz grave, trêmula, sinistra, decididamente fantasmagórica. Uma nuvem esbranquiçada esvoaçava à sua direita, e as luzinhas do celular piscavam no meio dela.
- Quem é você? Sai pra lá, assombração. Hoje é Natal, não Halloween. Desencosta, rapá.
"Calma, amigo. Sou um fantasma do bem. Seu anjo da guarda, se você prefere acreditar em outro tipo de fantasma. Vim te fazer um favor. Você já conhece essa tal Paola Grossi?
- Não, não conheço, vou desbravar. Pelas fotos, é um espetáculo, um monumento, uma verdadeira lowcura...
"Gostaria de vê-la pessoalmente antes de marcar o TD? Podemos fazer-lhe uma visitinha, coisa rápida, vamos voando e não pegamos trânsito."
- Voando? Essas historinhas do Tricampeão estão cada dia mais viajadas...
"É verdade, se fosse uma crônica do Fortimbrás ou do Nazrudin, a uma hora dessas estaríamos na fila do busão, mas o Tricampeão é um escritor moderno, com preocupações sociais, não explora seus personagens, preocupa-se em garantir-lhes as melhores e mais humanas condições de trabalho, embarquemos neste mágico tapete voador, que tem até ar condicionado, olha só, vrrrrummmmmm, vrrrrrummmmm, que arzinho bão, sobe aí e vamos dar um rolê, companheiro."
Não tinha como recusar essa oferta. Sentou no tapete e voaram na direção de Moema.
"Vamos passar por alguns lugares que você conhece. Por exemplo, lembra-se daquele flat ali, onde moram diversas GPs? Já teve umas experiências ruins lá, hein?"
- Nem me fale, é aí que mora a Daniella Strupicelly, a pior foda da minha vida. Não beija, não chupa, não mete, não sorri, não conversa, mais sem graça que comer esfiha de abobrinha em comício do PMDB. Dinheiro jogado fora.
"Mas você não postou o TD, postou?"
- Não postei porque não queria zoação pro meu lado daqueles caras do forum, já pensou, gastei trezentas pilas com aquela baranga.
"Fez mal, companheiro, a Strupicelly e sua companheira de quarto, a Dragony Cagnon, faturaram bastante com a picaretagem, e agora têm uma concessionária de automóveis, uma construtora e uma fábrica de helicópteros."
Não respondeu. Agora sobrevoavam uma favela, e o fantasma voltou a falar:
"Naquela favela ali mora a Raimunda Pocotó, lembra-se dela?"
- Hummmmm, é claro que me lembro. Não era nenhuma princesa, mas metia pra caralho. Minha melhor foda, sem dúvida. Pena que sumiu e não consegui mais achá-la.
"Pois é, a Raimunda quebrou, ficou sem clientes porque suas fotos no site eram verdadeiras. A coitada não tinha referências nos foruns de putaria, já que ninguém postou os TDs que fez com ela."
- Eu não postei pra galera não me chamar de BOP... e também porque eu não queria que muita gente comesse... um pouco de exclusividade é bom, né? Senão fica parecendo puta de beira de estrada, que todo mundo come, é claro que você entende...
"Bem, agora realmente ninguém vai comer. Engordou, despencou, cortou o cabelo pra por aplique, está pensando em voltar a atender, mas desta vez vai ter que abusar do photoshop."
- Talvez eu tenha errado em sonegar os TDs. Mas é que às vezes não tenho vontade de escrever, sabe, falta de prática...
"Chegamos, veja. Lá está a Paola. E com um cliente."
- Ué, mas aquele parece comigo. Parece não, sou eu! O que está acontecendo?
"Todos tapetes voadores homologados para figurar nas crônicas do Tricampeão podem mover-se tanto no tempo quanto no espaço. Pensei que você acharia legal espiar um pouquinho no futuro."
- Não estou vendo a Paola, estou vendo é três homens mal encarados conversando comigo.
"Paola Grossi é nome de guerra de Toríbio Largonne, o travesti mais barra pesada de São Paulo. Os outros dois são capangas dele. Usam fotos falsas para atrair os otários e assaltá-los no seu flat."
- Caralho, um traveco operado com tanto tempo de praça, vejo essas fotos dela no site há quase um ano, ninguém denunciou não?
"Você não é o único que sonega TDs, meu caro. Muitos tiveram vergonha de postar uma Pisada na Bola dizendo que foram enganados por fotos falsas. E o Toríbio não foi operado, nem pretende ser. Quando a vítima aceita de boa pagar um boquete, ele libera o cara depois de uma mera gozada na boca, mas quem resiste, como você está fazendo, ele esmerilha o cu sem dó."
- Você só pode estar brincando, eu não estou lá, estou aqui em cima, no tapete voador junto com você, cadê você, branquelão? não me deixe aqui, sai pra lá, tira a mão da minha bunda, ô folgado, me solta, merda, para de balançar o prédio, que eu fico tonto, acende a luz, ai, minha cabeça...
Quando acordou, o flat de Paola Grossi, aliás Toríbio Largonne, havia sumido. A mobília era a do seu próprio apartamento. A luz estava acesa. Dois dos facínoras tinham ido embora, mas o maldito traveco ainda estava sentado ao seu lado, virado de costas. Pegou um vaso em cima da mesa da sala pra mandar ver na cabeça do fidaputa, o vaso era presente da sogra, melhor ainda, mas, quando tentou se levantar, a cabeça parecia de chumbo, soltou um suspiro e deitou-se novamente.
- Cara, você me deu um soco na boca, seu maluco. É assim que me agradece? Se não fosse eu, você já era.
- Quem?!?
- Sou eu, o Ademar, seu cunhado, porra, não me reconhece? Vim pedir pra me emprestar o apê do Guarujá, como faço todos os anos, te achei aí caído no chão, um fedor de gás da porra, te sacudi e você começou a gritar e a me bater, tá louco, caralho?
Tossiu. Respirou fundo. A névoa começou a se dissipar. Havia esquecido o gás aberto ao sair de casa, quando voltou deve ter dado alguns passos na direção do escritório, na pressa nem prestou atenção em cheiro de porra nenhuma, desmaiou, sonhou, arghh, que sonho terrível, o Tricampeão pegou pesado agora, que foi que eu fiz, já sei, foi o que eu não fiz, mas aprendi a lição, me deixa fora das suas histórias daqui pra frente ok?
No mesmo dia, começou a botar os TDs em dia. Ainda sobrou tempo pra desbravar uma puta, não a Paola Grossi, cê besta sô, foi uma tal de Perla Tamagoshi, uma merda, japonesa paraguaia, mas postou o TD, e desde aquele dia, nunca mais sonegou, sempre postava religiosamente, se dava bem, postava, se dava mal, postava, se dava mais ou menos postava, a puta dava bolo postava, brochava postava, e foi assim que, depois de menos de 6 anos, atingiu a histórica marca de mil TDs.
Trica