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Os telegramas do Wikileaks, a mídia e o MST
23 de dezembro de 2010
Por Igor Fuser - Jornalista e professor*
Da página do MST
Os jornais brasileiros divulgaram na semana passada referências ao MST feitas em telegramas sigilosos enviados nos últimos anos por diplomatas estadunidenses no Brasil aos seus superiores em Washington e revelados pela rede Wikileaks. Algumas reflexões podem ser feitas a partir da leitura desse material.
1. A imprensa empresarial brasileira manteve nesse episódio sua habitual postura de hostilidade sistemática ao MST, apresentado sempre por um viés negativo, e sem direito a apresentar o seu ponto de vista. Para os jornais das grandes famílias que controlam a informação no país, como os Marinho e os Frias, o acesso a vazamentos da correspondência diplomática representou a chance de lançar um novo ataque à imagem do MST, sob o disfarce da objetividade jornalística. Afinal, para todos os efeitos, não seriam eles, os jornalistas, os responsáveis pelo conteúdo veiculado, e sim os autores dos telegramas.
Desrespeitou-se assim, mais uma vez, um princípio elementar da ética jornalística, que obriga os veículos de comunicação a conceder espaço a todas as partes envolvidas sempre que estão em jogo acusações ou temas controvertidos. Uma postura jornalística honesta, voltada para a busca da verdade, exigiria que O Globo, a Folha e o Estadão mobilizassem seus repórteres para investigar as acusações que diplomatas dos EUA no Brasil transmitiram aos seus superiores. Em certos casos, nem seria necessário deslocar um repórter até o local dos fatos. Nem mesmo dar um telefonema ou sequer pesquisar os arquivos. Qualquer jornalista minimamente informado sobre os conflitos agrários está careca de saber que os assentados no Pontal do Paranapanema mencionados em um dos telegramas não possuem qualquer vínculo com o MST. Ou seja, os jornais que escreveram sobre o assunto estão perfeitamente informados de que o grupo ao qual um diplomata estadunidense atribui o aluguel de lotes de assentamento para o agronegócio não é o MST. O diplomata está enganado ou agiu de má fé. E os jornais foram desonestos ao omitirem essa informação essencial.
Esse é apenas um exemplo, revelador da postura antiética da imprensa em todo o episódio. Se os vazamentos do Wikileaks mencionassem algum grande empresário brasileiro, ele seria, evidentemente, consultado pela imprensa, antes da publicação, e sua versão ganharia grande destaque. Já com o MST os jornais deixam de lado qualquer consideração ética.
2. A cobertura da mídia ignora o que os telegramas revelam de mais relevante: a preocupação das autoridades estadunidenses com os movimentos sociais no Brasil (e, por extensão, na América Latina como um todo). Os diplomatas gringos se comportam, no Brasil do século XXI, do mesmo modo que os agentes coloniais do finado Império Britânico, sempre alertas perante o menor sinal de rebeldia dos “nativos” nos territórios sob o seu domínio. Nas referidas mensagens, os funcionários se mostram muitos incomodados com a força dos movimentos sociais, e tratam de avaliar seus avanços e recuos, ainda que, muitas vezes, de forma equivocada. O “abril vermelho”, em especial, provoca uma reação de medo entre os agentes de Washington. Talvez por causa da cor… A pergunta é: por que tanta preocupação do império estadunidense com questões que, supostamente, deveriam interessar apenas aos brasileiros?
3. O fato é que o imperialismo estadunidense é, sim, uma parte envolvida nos conflitos agrários no Brasil. Essa constatação emerge, irrefutável, no telegrama que trata da ocupação de uma fazenda registrada em nome de proprietários estadunidenses em Unaí, Minas Gerais, em 2005. Pouco importa o tamanho da propriedade (70 mil hectares, segundo o embaixador, ou 44 mil, segundo o Incra). O fundamental é que está em curso uma ocupação silenciosa do território rural brasileiro por empresas estrangeiras. Milhões de hectares de terra fértil – segundo alguns cálculos, 3% do território nacional – já estão em mãos de estrangeiros. O empenho do embaixador John Danilovich no caso de Unaí sinaliza a importância desse tema.
4. Em todas as referências a atores sociais brasileiros, os telegramas deixam muito claro o alinhamento dos EUA com os interesses mais conservadores – os grandes fazendeiros, os grandes empresários dos municípios onde se instalam assentamentos, os juízes mais predispostos a assinarem as ordens de reintegração de posse.
5. Por fim, o material veiculado pelo Wikileaks fornece pistas sobre o alcance da atuação da embaixada e dos órgãos consulares dos EUA como órgãos de coleta de informações políticas. Evidentemente, essas informações fazem parte do dia-a-dia da atividade diplomática em qualquer lugar no mundo. Mas a história do século XX mostra que, quando se trata dos EUA, a diplomacia muitas vezes funciona apenas como uma fachada para a espionagem e a interferência em assuntos internos de outros países. Aqui mesmo, no Brasil, fomos vítimas dessa postura com o envolvimento de agentes dos EUA (inclusive diplomatas) nos preparativos do golpe militar de 1964. À luz desses antecedentes, notícias como a de que o consulado estadunidense em São Paulo enviou um “assessor econômico” ao interior paulista para investigar a situação dos assentamentos de sem-terra constituem motivos de preocupação. Será essa a conduta correta de um diplomata estrangeiro em um país soberano?
*Professor da Faculdade Cásper Líbero, doutorando em Ciência Política na USP e membro do conselho editorial do Brasil de Fato.
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassi ... antiu-lula
Pronaf, a arma que garantiu Lula
Enviado por luisnassif, qui, 23/12/2010 - 09:15
Coluna Econômica
Os vários balanços sobre o governo Lula deixaram de lado aquele que talvez tenha sido o maior fator de sucesso, ao lado do Bolsa Família: o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar).
Foi esse programa que permitiu a ampliação da produção da agricultura familiar – a que mais contribui para a produção de alimentos para consumo doméstico -, sustentando preços de alimentos compatíveis com a renda interna.
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O Pronaf financia projetos individuais ou coletivos para familiares e assentados da reforma agrária. Fornece crédito para custeio da safra ou investimento em equipamentos ou infraestrutura de produção. Graças a ele, houve recordes nas vendas de pequenos tratores e equipamentos agrícolas.
O acesso aos recursos se dá através do sindicato rural ou da Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), que fornece uma Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), definindo a renda anual e as atividades explorador pelo agricultor. Enquadram-se no programa famílias com renda bruta anual de até R$ 110 mil.
De posse da declaração ele será direcionado para linhas de crédito adequadas. No caso dos assentados, o caminho é o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ou a Unidade Técnica Estadual (UTE).
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Pesquisa de Avaliação da Qualidade dos Assentamentos, Produção e Renda, do INCRA, revelou que mais da metade dos assentamento agrícolas do país tiveram acesso às linhas do Pronaf. Nos últimos anos, cerca de 394 mil moradias foram reformadas ou construídas com esses recursos.
O programa foi dividido em várias linhas, Pronaf Mulher, Pronaf Jovem, Pronaf Semi-Árido, Pronaf Florestal e Pronaf Agroindústria.
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O Portal do Agronegócio fez um belo levantamento de como uma pequena propriedade familiar se beneficiou do programa. Esmeraldo Pedroso, de Porto Velho, tem 95 hectares, 20 ha de área plantada.
Para acessar o financiamento, ele foi ajudado pela Emater na preparação dos projetos técnicos. O primeiro financiamento, de R$ 7,2 mil, permitiu plantar dois ha de palmito de pupunha, copaíba, andiroba e outras plantas.
Da andiroba e da copaíva extrai óleos para cosméticos de remédios.
90% de sua produção vão para a Associação dos Pequenos Produtores do Projeto Reca, que industrializa e comercializa a matéria-prima recebido dos agricultores familiares associados.
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Com o aumento da área plantada, melhorou a renda e houve necessidade de mais equipamentos. Em 2008 conseguiu mais R$ 8 mil, que lhe permitiram plantar mais quatro ha e comprar uma carreta para o trator.
Finalmente, acesso o Pronaf Mais Alimentos, levantou R$ 13 mil a juros de 2% ao ano, três anos de carência, oito para pagar. Adquiriu uma roçadeira e uma enxada rotativa. O próximo passo será outro empréstimos para fiunanciar um caminhão.
Sua renda anual atual é de R$ 60 mil.
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No estudo "Pobreza e a Nova Classe Média Rural", o pesquisador Marcelo Neri mostra que a nova classe C rural – com renda domiciliar de R$ 1.126 a R$ 4.854 por mês – cresceu 72% desde 2003. Naquele ano, representava 20,6% da população rural; hoje em dia, 35,4%.
A redução da desigualdade foi mais rápida na zona rural , sobretudo nas regiões mais pobres, segundo conclusão de Neri.
Por Gê
Olá Nassif,
Tem uma informação nessa matéria que deve ser corrigido.
Onde se lê:
“Pesquisa de Avaliação da Qualidade dos Assentamentos, Produção e Renda, do INCRA, revelou que mais da metade dos assentamento agrícolas do país tiveram acesso às linhas do Pronaf. Nos últimos anos, cerca de 394 mil moradias foram reformadas ou construídas com esses recursos.”
O PRONAF não financia reforma ou construção de casas em assentamentos da Reforma Agrária no Brasil, o crédito responsável por essas construções e reformas de casas são advindos dos Créditos de Instalação Modalidades Aquisição e Recuperão Materiais de Construção respectivamente.
E em relação às 394 mil moradias que foram reformadas ou construídas faz do INCRA, além de um dos maiores órgãos de Reforma Agrária do mundo, também um dos maiores financiadores de habitações no nosso país.
Para mais detalhes sobre os créditos de instalação do INCRA, o material completo pode ser visto na Norma de Execução nº. 79/2009.
Abraços
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve ... s-eua.html
WikLeaks e MST: Professor desmente O Globo e o vice-consul dos EUA
“A palavra ‘espião’ é invenção do Globo”, afirma professor
Da Página do MST
O professor Clifford Andrew Welch, do curso de história da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), foi citado como fonte das informações de telegramas remetidos por diplomatas estadunidenses no Brasil aos Estados Unidos, divulgados pelo Wikileaks.
O jornal O Globo publicou uma reportagem sobre esses telegramas em19/12, dando destaque à existência de espiões do MST dentro do Incra e sobre uma suposta prática dos assentados “de alugar a terra de novo ao agronegócio”.
“Nunca falei e jamais falaria algo assim. No primeiro lugar, a palavra ‘espião’ é invenção do Globo, porque não aparece nos relatos diplomáticos disponibilizados pelos jornais”, denuncia Welch.
Welch desmente também informações de Benjamin A. LeRoy, vice-consul do Consulado Geral dos EUA, em São Paulo.
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Abaixo, leia esclarecimento do professor.
Wikileaks, a imprensa, o MST e eu
Por Clifford Andrew Welch, na Página do MST
Demorou. Em abril de 2007, pedi pessoalmente uma cópia do relatório do investigador dos Estados Unidos da América que me entrevistou sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Pedi de novo por email em setembro, mas nem resposta recebi, muito menos o documento.
Foi o grupo Wikileaks que recentemente revelou os resultados dos andamentos do agente estadunidense no Pontal do Paranapanema, São Paulo, e meu nome estava no meio das reportagens que saíram nos jornais nos dias 19 e 20 do mês atual.
Como coordenador ajunto do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (Nera) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em abril de 2009, confesso que estava pouco animado com a visita do Vice Consul Benjamin A. LeRoy, do Consulado Geral dos EUA, em São Paulo, quando nos pediu uma hora para “conhecer o trabalho do Nera e aprender um pouco mais sobre reforma agrária e movimentos sociais de sem-terra,” como nos escreveu a assistente de assuntos políticos do consulado, Arlete Salvador.
Como historiador especializado em estudos da política externa dos EUA na América Latina, já conhecia figuras como LeRoy e seus relatórios. Eram fontes importantes para entender a natureza da interferência do império em sua esfera de influência. Agora o disco virou e era eu a fonte. Fiquei assustado com os erros do relatório de Benjamin, a distorção dos fatos interpretados pelo cônsul-geral Thomas White e, mais uma vez, preocupado com o método empírico do historiador, que depende demais em documentos oficiais e notas jornalísticas.
Faz sentido confiar em um investigador que nem sabe onde estava ou com quem estava falando? O despacho que relata a investigação de Benjamin usa a sigla Uneste no lugar da sigla Unesp e dá como a minha afiliação institucional a Universidade de Michigan, ambas afirmações equivocadas.
Pior, ainda, é a fala atribuída a mim por Benjamin e relatado pelo White que ficou como manchete no Globo: “MST teria espiões no Incra para orientar invasões”. Nunca falei e jamais falaria algo assim. No primeiro lugar, a palavra “espião” é invenção do Globo, porque não aparece nos relatos diplomáticos disponibilizados pelos jornais.
No “telegrama” em questão de 29 de maio, White escreveu que “O MST segue uma metodologia programada em suas ocupações de terra que inclui a utilização de contatos dentro do Incra para ajudar selecionar alvos, segundo [...] Welch.”
Em outro momento, o cônsul relata que eu o informei de que “o MST aproveita contatos dentro do Incra para determinar qual será a próxima área sujeito a desapropriação.” Segundo o relato, “Welch contou para Benjamin que o Incra não disponibiliza as informações ao público e que o único jeito para o MST acessar os dados seria através de informantes dentro do Incra.”
O jeito como o cônsul interpretou o relato de Benjamin de coisas que não falei sobre as relações entre o MST e o Incra reflete mais do macartismo que a realidade do Brasil. Macartismo é a ideologia do “medo vermelho” que causou alarme nos EUA nos meados do século passado quando foi alegado que espiões russos infiltrados no setor público estavam minando a segurança nacional do país.
A atual situação no Brasil não tem nada ver com a Guerra Fria, obviamente. O dever constitucional do Incra é fazer reforma agrária. O MST procura pressionar para que o Incra realize a reforma agrária.
É bom lembrar, como falei para o Benjamin, que as informações do Incra são públicas para todo mundo. Me lembro que tentei explicar para o Benjamin que a maioria das ocupações do MST não foram realizadas em maneira aleatória, mas a partir de áreas com desapropriação em andamento. Quer dizer, o movimento faz esforço para colaborar com o processo constitucional de identificação de terras improdutivas ou sujeito a desapropriação por violar as leis trabalhistas ou ambientalistas. É o cônsul que inventou um sentido de clandestinidade.
No mesmo documento de abril, que tem o titulo “O método do MST: Tira proveito do governo, alienar os vizinhos,” o cônsul toma vantagem da investigação do Benjamin para alegar que membros do MST que ganham lotes de reforma agrária do Incra vão acabar “alugando ao agronegócio” a terra “numa pratica cínica e irônica.” A fonte para esta informação parece ter sido “um líder do agronegócio” em Presidente Prudente.
Fora de contexto, assim como apresentado no despacho diplomático, o aluguel dos lotes parece ser de fato “cínico e irônico.”
O relatório não contempla a pressão das usinas nos assentados, com oferta de dinheiro fácil para o plantio da cana de açúcar, que tem causado muitos problemas aos assentados, como demonstram várias pesquisas realizadas pela UNESP. A coordenação nacional do MST é declaradamente contra a prática.
São outros erros de fato e interpretação nos documentos e noticias. A Folha aproveitou o esvaziamento dos documentos para alegar que o MST está em “declínio,” que a “base do movimento encolheu.” O Globo dá destaque para um suposto abandonou da causa da luta pela terra pelo presidente Lula, uma interpretação que apareça nos telegramas do White.
Porém, é difícil sustentar estes argumentos. De fato, os cálculos das estatísticas do governo Lula bem como os do Nera sustentam o contrário, mostrando de que Lula assentou mais famílias que o presidente Fernando Henrique Cardoso que declarou ter feito mais para reforma agrária que qualquer outro presidente brasileiro, mas o governo Lula defende que assentou 59 por cento dos beneficiários de reforma agrária na história do Brasil.
No caso das ocupações de terras e o número de famílias envolvidas na luta pela terra, as estatísticas são quase iguais. Durante os oito anos do governo Cardoso, 571.650 famílias participaram em 3.876 ocupações organizadas por mais que 20 movimentos. Os números do governo Lula ainda não foram calculados totalmente, mas durante os primeiros sete anos, são registrados a participação de 480.214 famílias em 3.621 ocupações.
Temos que agradecer Wikileaks por quebrar o sigilo que ainda reina nos círculos diplomáticos décadas depois do final da Guerra Fria. Em meu caso, deu para desmentir fatos equivocados e desconstruir interpretações anacrônicas, inclusive das reportagens da grande imprensa.
* Por Clifford Andrew Welch, Prof. Dr. Adjunto do Curso de História da Universidade Federal de São Paulo.
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Estadão, inimigo da reforma agrária
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
por Altamiro Borges, no seu blog
O jornal O Estado de S. Paulo, que já nasceu demonizando as lutas camponesas (basta lembrar suas matérias hidrófobas contra a revolta de Canudos) e defendendo os interesses da oligarquia paulista do café, não desiste nunca da sua cruzada contra a reforma agrária. Em editorial na semana passada, intitulado “Deixem a agricultura trabalhar”, ele voltou a atacar todos – MST, sindicalismo rural, partidos de esquerda e setores do governo Lula – que defendem uma justa distribuição de terras num dos países de maior concentração fundiária do planeta. Todos seriam entraves ao “desenvolvimento econômico” do Brasil.
Para o Estadão, os heróis do povo brasileiro são os ricos fazendeiros. “Com superávit comercial de US$ 58,2 bilhões neste ano, o agronegócio é mais uma vez a principal fonte de sustentação das contas externas brasileiras, graças ao seu poder de competição”, bajula o editorial, que parece saudoso das velhas teses oligárquicas sobre a “natureza agrícola” do país. Não há qualquer linha de crítica à concentração de terras nas mãos de poucos latifundiários, ao uso do trabalho escravo e infantil, à abjeta contratação de jagunços e pistoleiros ou às práticas devastadoras do meio ambiente tão comuns no campo brasileiro.
“Um recado político” para Dilma
Este editorial, dos vários já publicados, tem um objetivo nítido. Com base numa entrevista do atual ministro da Agricultura, Wagner Rossi, já confirmado para continuar no cargo, ele visa dar um “recado político” para o futuro governo. “O setor precisa de segurança para produzir bem e para ser competitivo. É um lembrete oportuno, a duas semanas da posse da presidente eleita, Dilma Rousseff”. O texto do Estadão expressa o temor dos ruralistas, para quem “o agronegócio continua na mira do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do PT, do MST e de outras organizações comprometidas com as bandeiras do atraso”.
Sempre ancorado na entrevista do ministro, o Estadão centra seus ataques exatamente na revisão dos índices de produtividade usados para a desapropriação de terras. Lembra que uma portaria já passou pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, mas que está engavetada no Ministério da Agricultura – e assim deve continuar. Em síntese, a família Mesquita se mantém na dianteira da luta contra a reforma agrária. Para ela, esta bandeira é coisa do passado e seus defensores representam o “atraso”. Neste esforço militante, o jornal não vacila em abandonar qualquer tipo de imparcialidade e difunde as maiores mentiras.
Mentiras sem escrúpulos
Sem escrúpulos, o editorial afirma que o agronegócio é responsável pela “produção eficiente de alimentos abundantes, bons e baratos, acessíveis a qualquer trabalhador… Pode ter havido razão econômica para a reforma agrária há algumas décadas. Mas a agropecuária transformou-se amplamente nos últimos 40 anos. O setor produz muito mais que o necessário para abastecer o mercado interno e para atender à crescente demanda internacional… A agropecuária brasileira se modernizou. Os defensores da reforma agrária continuam no passado. A presidente eleita faria bem ao País se escolhesse o compromisso com a modernidade”.
Estas teses, infelizmente encampadas por alguns desenvolvimentistas, não levam em conta que a reforma agrária é uma questão de justiça social e de ampliação da democracia no Brasil – a vitória do direitista José Serra nos redutos do agronegócio deveria servir de alerta! Elas também ignoram o papel econômico de uma distribuição mais justa das terras no Brasil. Neste sentido, o Estadão mente descaradamente. Não é verdade que o agronegócio garante a comida na mesa dos brasileiros. Muito pelo contrário. São os 4,5 milhões de famílias de pequenos proprietários que garantem 80% dos alimentos consumidos no país.
Atentado à inteligência do leitor
Como observou Lúcio Mello, num excelente artigo publicado no Blog da Reforma Agrária, o editorial do Estadão é um atentado à inteligência dos leitores. Ele abusa da desinformação e das meias-verdades. Omite, inclusive, os dados oficiais recém divulgados pelo censo do IBGE. “O agronegócio não é responsável por alimentos bons, baratos e de qualidade. Por mais que comamos soja, açúcar e café e [bebamos] suco de laranja, é o produtor familiar que abastece em sua maioria as cidades de leite, feijão e mandioca, gerando renda e impedindo o aumento do fluxo migratório para São Paulo, Rio de Janeiro” e outras capitais.
Ponderado, ele observa que “o editorial louva a importância do agronegócio na sociedade, sobretudo na pauta das exportações brasileiras e na promoção do superávit primário. Até aí, nada de errado. É reconhecido o papel da monocultura agroexportadora na chamada modernização conservadora entre 1964 e o fim da década de 70”. De resto, tudo é mentira.
Entre outras distorções, o Estadão omite que o agronegócio “tem parcela de culpa considerável na dívida pública brasileira, seja através das sucessivas dívidas simplesmente não pagas ou de repasses com ônus ao tesouro de projetos agropecuários faraônicos”, explica Lúcio Mello. Estima-se que esta dívida atingiu R$74 bilhões em maio de 2008. Isto sem falar da anistias às dívidas, dos juros subsidiados e de outras benesses do Estado.