Só para ajudar a esclarecer...
Perigo azul
O Viagra, destinado a homens com impotência sexual, ganha espaço entre os jovens, que tomam o remédio para melhorar o desempenho. Médicos alertam para os riscos do uso indiscriminado
Da Redação
Viagra. A pílula azul milagrosa foi lançada há três anos e virou febre mundial. Homens com dificuldade de ereção olhavam para o alto e agradeciam aos céus pela descoberta. A partir dela, o ‘‘amigo’’ ali de baixo nunca mais seria motivo de pânico, vexame ou frustração. Os mais velhos eram os mais beneficiados e indicados para tomar Viagra. Mas o homem consegue mudar os paradigmas numa velocidade inimaginável.
O uso da pílula ‘‘milagrosa’’ passou a ser indiscriminado, inclusive por jovens aparentemente sem necessidade do remédio. Em dez das 12 farmácias visitadas pela reportagem do Correio, os balconista afirmam já ter vendido Viagra para homens na faixa dos 20 anos. Hoje, a compra é facilitada porque não há necessidade de apresentação de receita ou prescrição médica. ‘‘Deveria haver maior controle. Antes, a venda era muito rígida, hoje, liberou geral’’, diz o chefe da urologia do HFA, José Carlos de Almeida, 45 anos.
‘‘Em épocas de Micarecandanga e carnaval, muitos garotos na faixa de 25 anos compram o comprimido’’, conta o subgerente da Drogaria Unicor, Elmo Luis, 27 anos. Ele diz que a maioria compra para impressionar as parceiras ou por pura curiosidade.
Nonato Santos, 32, subgerente da Distrital Drogaria, concorda com Elmo. ‘‘A maioria que passa aqui tem entre 25 e 30 anos. Sempre para experimentar, testar o remédio. Não tenho um cliente fiel nessa faixa etária. São compradores esporádicos.’’
A popularização do Viagra vem da influência dos grandes centros. No Rio de Janeiro e em São Paulo, tomar a pílula virou moda. E pior: tem gente cheirando o comprimido, como cocaína. Quatro jovens de Brasília contam suas experiências com o Viagra. Todos tomaram ou cheiraram o remédio pelo menos uma vez na vida, em circunstâncias e por motivos diferentes. Nenhum deles quis se identificar e, por isso, são apresentados com nomes fictícios.
‘‘Raspamos e cheiramos’’
Rodrigo, 22 anos e estudante de Administração, e Ricardo, 20 anos e vendedor, ultrapassaram os limites do bom senso. Não se limitam a usar o Viagra ocasionalmente para impressionar a parceira do momento. Os dois cheiram o comprimido com uma certa constância. ‘‘Tem mais ou menos cinco meses que comecei a usar Viagra’’, diz Rodrigo, o primeiro da dupla a experimentar o remédio, por influência de amigos da faculdade.
‘‘Falaram que era moda em São Paulo. Que a onda é misturar com álcool para ficar doidão e aumentar a potência sexual.’’ Os amigos de Rodrigo tinham até um esquema para comprar o remédio mais barato. Câmbio negro mesmo. ‘‘Na primeira vez que tomei, fiquei com medo. Mas não aconteceu nada, tive uma noite ótima com minha namorada. Transamos três vezes seguidas, não perdi a ereção nem um pouco e desde então tomo todo fim de semana.’’
Ricardo começou a cheirar Viagra por influência de Rodrigo. Os dois malham juntos numa academia de Brasília. Típicos jovens de academia, que passam horas malhando. Ricardo achava que o medicamento só fazia efeito nos homens com problemas de ereção. Mudou de opinião no dia que cheirou. ‘‘A gente raspou o comprimido e cheirou, assim como se faz com cocaína. Bebi bastante, pois dizem que só dá onda se misturar com bebida alcoólica.’’
Nesse dia, Ricardo transou com uma menina com quem saía na época. ‘‘Não cansei mesmo depois de ter cinco relações’’, diz. Num determinado momento, tomou um susto. ‘‘Senti meu coração disparar e fiquei com medo. Medo mesmo. Mas não aconteceu de novo, então continuo tomando’’, afirma ele, que usa o remédio há três meses. ‘‘Mas não tomo direto, só umas duas vezes por mês, até porque é caro. Cada comprimido sai por R$ 35,00.’’
‘‘Usei para impressionar’’
Antônio, 26 anos e professor de História, queria impressionar a namorada. ‘‘Não nos víamos há um mês e eu queria que aquela noite fosse muito especial’’, diz o morador do Lago Norte. Até certo ponto, pode-se dizer que ele foi responsável. Antes de tomar, conversou com um médico que fez um alerta: ele não poderia misturar a pílula a álcool e deveria tomar muita água. À noite, Antônio foi a um barzinho com a namorada. ‘‘Só bebi suco de laranja e tomei o Viagra antes de voltar para casa.’’
Na época, com 24 anos, ele sentiu o efeito 40 minutos depois. A noite foi realmente especial para a namorada, e Antônio sentiu-se recompensado. ‘‘Transamos só três vezes. Mas foram as três mais longas da minha vida’’, diz, rindo. Mesmo assim, não recomenda a ninguém. ‘‘É muito forte, muito forte mesmo. Não é brincadeira. Eu ouvia os batimentos do meu coração. Ouvia!’’, ressalta. No dia seguinte, Antônio ainda sentia os efeitos do comprimido. ‘‘Eu continuava muito disposto, com o coração disparado.’’
Além dos problemas momentâneos, ele percebeu que o remédio pode mesmo viciar. ‘‘Se o cara não tem boa cabeça, acaba ficando dependente. Vai achar que não consegue transar sem Viagra nunca mais. Tem de ter cabeça fria.’’ Mas será que Antônio usaria de novo? ‘‘Não. Não há necessidade pra isso. Sou muito novo.’’
‘‘Senti tonturas’’
Rogério, 17 anos, estudante do 3º ano do ensino médio, tomou Viagra apenas uma vez. Assim como Ricardo e Rodrigo, passa algumas horas na academia diariamente. ‘‘Foram dois comprimidos, misturados a muito uísque. Passei a noite inteira dançando, fiquei mais disposto’’, diz. No final da noite, Rogério saiu da boate com uma menina. ‘‘Transei dentro do carro do meu primo. Ela ficou impressionada com a rapidez com que eu conseguia novas ereções. Transamos quatro vezes em apenas duas horas’’, diz.
Mesmo satisfeito com o desempenho, Rogério não sabe se tomará o remédio novamente. Ele sentiu na pele alguns problemas em tomar o Viagra sem acompanhamento médico. ‘‘No outro dia, fiquei com tonturas e tive tremedeiras até o final da tarde. Estou meio grilado e não sei se terei coragem de tomar de novo.’’
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Uso do Viagra
Efeitos colaterais
Rubor facial
Dor de cabeça
Obstrução nasal
Náusea
Visão azul - alterações visuais leves
Riscos
Vasodilatação
Hipotensão — pode levar pessoas que têm problemas no coração à isquemia e, posteriormente, ao infarto
Desmaio
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Com a palavra, os médicos
‘‘Chamamos isso de uso recreativo do Viagra. Não aconselho de forma alguma’’
‘‘O garotão de 20 e poucos anos em geral não precisa disso’’
Mário Pedro da Silveira
Responsável pelos setores de andrologia do Hospital das Forças Armadas e do Hospital de Base
‘‘O remédio não é feito para entrar no pulmão’’
Dartiu Xavier da Silveira
Professor de pós-graduação em psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo
‘‘Dor de cabeça e rubor facial no dia seguinte são os efeitos colaterais leves’’, diz.
Sidney Glina
Uurologista, chefe do Hospital Ipiranga, em São Paulo, e Presidente da Sociedade Internacional para Pesquisa em Sexualidade e Impotência