Continuando com os músicos clássicos:
Carl Nielsen
1865-1931
Carl August Nielsen nasceu em 9 de junho de 1865, em Sortelung, pequeno vilarejo da ilha de Funen, uma das 406 ilhas que compõem o território da Dinamarca. De origem pobre, um dos doze filhos do pintor de paredes Niels, nada indicaria que o pequeno Carl se tornaria uma das figuras mais importantes da história da arte de seu país e seu maior compositor. A Dinamarca, país pequeno e isolado no norte da Europa, não viu muitos de seus filhos obter fama e prestígio internacionais. A única exceção era, até aquela data, o escritor Hans Christian Andersen - curiosamente, também natural de Funen.
Niels vivia uma vida pacata como pintor e decorador até conseguir um segundo emprego como violinista. Tal ocupação paralela mudou o destino de Carl, que começou a aprender alguns rudimentos de música com seu pai. O interesse do menino era tanto que logo lhe contrataram um professor de violino chamado Petersen. Quando tinha oito anos, tocou em um baile sua primeira "composição", uma polca. Niels reprovou a obra: "ninguém poderia dançá-la".
Carl iria começar a trabalhar como auxiliar de padeiro quando, estimulado pelo pai, obteve um posto na banda militar de Odense, capital da ilha de Funen. Em Odense, Carl logo tornou-se o melhor músico da banda, atraindo a atenção de muita gente importante. Tanto que, em 1883, quando completava 18 anos, um grupo reuniu fundos para que Carl viajasse para Copenhagen, capital da Dinamarca, localizada na ilha de Sjaelland, extremo leste do país. Lá, conheceu o mais importante compositor dinamarquês da época, Niels Gade, que o encaminhou para o Conservatório de Copenhagen. Em janeiro de 1884, Carl Nielsen deixava definitivamente Funen - uma etapa de sua vida se cumpria.
Nielsen conseguiu estudar por três anos no Conservatório, com todas as despesas pagas pelos patronos de Odense. Em 1888, estreou com grande sucesso sua primeira obra de peso, a Pequena suíte para cordas, que batizou de Opus 1. A imprensa fez inúmeros elogios: foi a primeira crítica positiva de sua carreira. No ano seguinte, obteve o posto de violinista da Orquestra do Teatro Real de Copenhagen e uma bolsa de estudos para viajar a Alemanha. Nielsen ficou em Berlim até 1891. Em uma das inúmeras viagens que fez pela Europa no período, foi a Paris, onde conheceu a escultora Anne Marie Brodersen. Poucos meses depois se casaria com a artista, que seria sua companheira até o final da vida.
A carreira de Nielsen como compositor evoluía rapidamente. Em 1903 assinou seu primeiro contrato de publicação de suas obras e dois anos depois renunciava ao posto no Teatro Real para se dedicar excluisivamente à composição. Nesse período, compôs suas duas primeiras sinfonias, dois quartetos de cordas, a cantata Hymnus amoris e a ópera Saul e Davi. Em 1906 estreou a comédia Maskarade, que fez imenso sucesso - tornou-se a ópera nacional dinamarquesa por excelência. O êxito da apresentação, regida pelo próprio compositor, fez com que Nielsen recebesse o convite para ser o diretor musical do Teatro Real, posto que ocupou por vários anos.
Foi como regente da Orquestra Real Dinamarquesa que Nielsen divulgou sua terceira sinfonia, dita Sinfonia espansiva, de 1911, que chegou a apresentar em Amsterdã e que ganhou carreira internacional. A fama de Nielsen como compositor e regente só crescia. Em 1915, deixou a Orquestra Real e tornou-se diretor da Sociedade de Música de Copenhagen, cargo anteriormente ocupado por Niels Gade. Em 1916 tornou-se conselheiro titular do Real Conservatório de Música, onde dava aulas. A reputação de Nielsen como "músico nacional" levou o governo de seu país a encomendar inúmeras obras. Uma das mais famosas é a cantata Primavera em Funen, escrita para os 1000 cantores da Sociedade Coral Dinamarquesa e que celebra a ilha onde o compositor nasceu.
Ao mesmo tempo, Nielsen tornou-se figura conhecida e requisitada no exterior. Freqüentemente trabalhava como maestro convidado da Orquestra Sinfônica de Gotemburgo, na Suécia, e da Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã, na Holanda. Em 1926, o Conservatório de Paris promoveu um Concerto Nielsen, que o compositor descreveu como uma das maiores experiências de sua vida. No programa, o Concerto para violino, a Sinfonia espansiva, a Suíte Alladin e a estréia mundial do Concerto para flauta.
A essa altura, Carl Nielsen já era uma celebridade dentro e fora da Dinamarca. Participava de concursos e congressos de música internacionais - em um festival em 1919, conheceu Jean Sibelius; em um concerto em 1925, encontrou-se com Igor Stravinsky; no Festival de Música de Frankfurt, em 1927, conheceu Béla Bartók e Arnold Schoenberg, além de ter sua Quinta Sinfonia regida por Wilhelm Furtwängler. Quando completou 60 anos, em 1925, foi festejado como herói nacional.
Também de herói foi seu funeral. Carl Nielsen faleceu na noite de 3 de outubro de 1931, de falência cardíaca. Em sua cerimônia fúnebre, na Catedral de Copenhagen, foi tocado o último movimento de seu Quinteto para sopros, um conjunto de variações sobre o hino luterano Meu Jesus, faz meu coração amar. Não poderia haver homenagem mais apropriada.
SUA OBRA
Carl Nielsen é dono de uma das mais vivas e originais obras do início do século XX. De personalidade simples e otimista, deixou marca sempre reconhecível em todas as suas composições. Um dos traços mais marcantes da obra de Nielsen é a busca constante por sinceridade e pureza de concepção. Nesse sentido, evitou sempre a vanguarda de sua época, que considerava "anti-natural": dessa maneira, Nielsen poderia ser facilmente considerado um conservador.
Mas se tal "conservadorismo" corresponde bem às suas primeiras obras (aproximadamente a fase que se extende da Pequena suíte até o Concerto para violino), não explica as peças de seu segundo ciclo criativo (da Quarta Sinfonia ao Concerto para clarinete), muito livres na forma, na harmonia e extremamente originais no contraponto intenso e na orquestração. A Sexta Sinfonia e o Concerto para clarinete, além das últimas obras para piano, por exemplo, são peças que nada devem à vanguarda "oficial" dos anos 1920.
Nielsen se destacou em três gêneros: a sinfonia, o concerto e a música de câmara. Essas são suas obras mais freqüentemente executadas mundo afora. Na Dinamarca, porém, são especialmente apreciadas suas canções e hinos, suas duas óperas (Saul e Davi e Maskarade)e as demais obras vocais. E há um campo menos conhecido, mas de grande qualidade, dentro de sua vasta produção: as obras para piano.
Sinfonias
Carl Nielsen, juntamente com Gustav Mahler e Jean Sibelius, é um dos últimos herdeiros da forma sinfônica criada por Haydn e Mozart no século XVIII. Enquanto Mahler tentava fazer da cada sinfonia um mundo, compondo obras desafiadoras - tanto em suas durações como em suas temáticas - e enquanto Sibelius tentava obter a forma perfeita que fizesse da sinfonia um "todo" orgânico e unificado, Nielsen compunha sinfonias mais tradicionais e ligadas à tradição germânica.
É comum a afirmação de que suas primeiras sinfonias compartilham muito o clima das obras de Brahms e Dvorák, mas isso só é completamente verdadeiro para a Rapsódia sinfônica, obra de 1889, e para a Primeira Sinfonia, composta em 1892. Entretanto, Nielsen já tem voz própria. Poucos compositores do século XX iniciariam uma sinfonia de maneira tão direta quanto o início de sua Primeira. Essa maneira assertiva de ir direto ao assunto se tornaria uma das marcas registradas de Nielsen e já está presente em sua primeira obra sinfônica de fôlego.
As três sinfonias subseqüentes se iniciam de maneira similar, sem rodeios. Mas nenhum início é tão explosivo quanto o da Segunda Sinfonia, de 1902, dita Os quatro temperamentos. É uma verdadeira explosão de ira musical, digna da curiosa marcação Allegro collerico. Nessa obra, as presenças de Brahms e Dvorák são totalmente substituídas pela voz própria, forte e marcante, do próprio Nielsen.
O subtítulo Os quatro temperamentos explica perfeitamente o "programa" da sinfonia. O primeiro movimento representa o homem impetuoso e colérico; o segundo, o homem indolente, bem-humorado; o terceiro, o homem melancólico, introspectivo; o quarto, o homem alegre e divertido, um tanto bobalhão. Nielsen inspirou-se em uma pintura rústica que viu na parede de um bar. No quadro, retratados os quatro diferentes tipos de pessoas que compõem o imaginário popular.
A Terceira Sinfonia tem também subtítulo: Espansiva. Seria essa uma sinfonia ainda mais expansiva que as duas irmãs mais velhas? Não. Curiosamente, a Sinfonia espansiva é a mais relaxada das três. O termo espansivo (em italiano) refere-se ao otimismo irrefreável da obra, que é puro amor à vida e à natureza (com a descrição idílica da ilha de Funen no segundo movimento, que conta com a participação de uma soprano e um barítono). Ao contrário das demais sinfonias, na Espansiva não há conflito.
A Quarta Sinfonia, dita A inextingüível, é certamente a mais popular das obras de Nielsen. É sua sinfonia mais romântica e a mais épica de suas obras. O subtítulo curioso se refere à vida e à força da natureza, que, segundo Nielsen, apenas a música pode representar com eficácia. Se na Sinfonia espansiva não há conflito, na Quarta tudo é conflito e resolução. Para representar o ciclo infinito vida-morte-renascimento, Nielsen encadeia todos os quatro movimentos tradicionais da sinfonia em um só, e amarra todos os temas a um belo motivo principal, que representa a vida. A luta é representada por um duelo épico de dois conjuntos de tímpanos, colocados em lados opostos da orquestra, que acontece no último movimento. No final, a vida vence e seu tema ressurge de maneira grandiosa e emocionante. É uma das mais épicas sinfonias de toda a história.
A Quinta Sinfonia é obra ainda mais audaciosa. Ela não tem título nem "programa" facilmente distingüível, mas é possível detectar sua temática principal, o conflito. Mas, ao contrário do que acontecia na Quarta, o conflito aqui é mais humano e difícil de resolver: a guerra. Nielsen compôs a Quinta em 1922, pouco após a Primeira Guerra Mundial, e a tragédia da luta mais sofrida da história ecooa em toda a sinfonia. É, juntamente com a Sexta, a única sinfonia de Nielsen que se inicia suavemente. É também a única do ciclo que tem uma estrutura não-ortodoxa: seis movimentos, encadeados em duas partes. Apesar da sinfonia começar psicologicamente muito mal, termina muito bem. Nielsen, apesar de todos os questionamentos, é um otimista incurável. Todas suas sinfonias se resolvem, e essa impressionante Quinta não poderia ser diferente. A obra, sem dúvida, é a mais ambiciosa do compositor, e uma das maiores, mais complexas e mais profundas sinfonias do século.
A Sexta Sinfonia, dita Semplice, é totalmente diversa. Nielsen é um compositor muito direto, sincero; mas, neste caso, ele adota meios oblíquos para passar sua mensagem. O subtítulo - que chegou a ser suprimido pelo autor, mas que foi adotado pela posteridade -, as melodias, a orquestração: enfim, todas as características superficiais da sinfonia fazem crer que esta é uma peça pastoral ou mesmo simplória. Nielsen alimentou o próprio engodo, ao dizer que desejava compor uma obra "de caráter completamente idílico". Que nada! O ouvinte observador percebe claramente: tudo nessa sinfonia é dito às avessas, como num grande enigma. O segundo movimento é o mais curioso e leva o nome de Humoreske. É uma sátira arguta à vanguarda musical do início do século. Orquestrado para flautim, clarinete, fagote, trombone e percussão, é música maluca, que zomba do modernismo forçado, artificial, que Nielsen desprezava.
Obra muito complexa, a Sinfonia semplice não é das sinfonias mais imediatamente palatáveis de Nielsen. Mas, com paciência, o ouvinte percebe que suas surpresas são deliciosas e que valem muitas audições. Eis uma obra que nunca perde o encanto: sempre sobra uma peça para encaixar no quebra-cabeça.
Concertos
Carl Nielsen não foi apenas um grande sinfonista, mas também um excelente compositor de concertos. Escreveu três. O primeiro é o glorioso Concerto para violino, composto em 1911. Os demais concertos foram inspirados pela amizade de Nielsen com o Quinteto de Sopros de Copenhagen. Planejou compor um concerto para cada membro do quinteto, mas morreu antes de terminar o ciclo. Compôs apenas os concertos para flauta e clarinete. Foi uma perda trágica: os três concertos restantes (para trompa, oboé e fagote) certamente transformariam o repertório para esses instrumentos.
O Concerto para violino é o menos conhecido dos concertos. Difícil saber o motivo desse esquecimento. É uma obra memorável, repleta de grandes melodias, cheia de clima. O crítico David Hurwitz arrisca um palpite: para ele, a obra - organizada em dois movimentos que agrupam dois andamentos cada - perde seu apelo no segundo movimento, pois o primeiro é tão maravilhosamente conclusivo que parece não precisar de complemento. Talvez, mas é grande música mesmo assim!
O Concerto para flauta é mais desafiador para o ouvinte. Tem também dois movimentos, mas sua estrutura é muito menos ortodoxa. Para acompanhar o solista, um trombone passa a importunar a pobre flauta, como se estivesse zombando de seu timbre suave. Dá até para ouvir as gargalhadas! Obra interessantíssima, rica e cheia de constrastes, o Concerto para flauta é o mais conhecido dos concertos de Nielsen.
Apesar das grandes virtudes dos demais concertos, o Concerto para clarinete é que é a sua mais importante obra concertante. Ele tem apenas um movimento e suas subdivisões não são facilmente perceptíveis. Podemos notar duas partes principais, uma rápida e outra moderada. Cada uma das partes tem um tema inicial principal, no qual todos os outros temas são baseados. Não há grande contraste entre as seções, mas ao final dos 25 minutos da obra, o ouvinte tem a sensação de que todos os tipos de movimentos de concertos foram abordados. (A Sétima Sinfonia de Sibelius, também em movimento único, passa exatamente a mesma impressão.)
Música de câmara
Nielsen compôs quatro quartetos de cordas, um Quinteto de cordas de juventude, um famoso Quinteto para sopros e um sem-número de obras menores para conjuntos de câmara. Os dois últimos quartetos, opp. 14 e 44, sua segunda Sonata para violino e piano, além do já citado Quinteto, são as obras principais.
O Quarteto op. 14, composto em 1898, tem uma veia dvorakiana evidente. A obra se inicia de maneira ampla, bem à maneira do Nielsen da primeira fase, com o memorável tema inicial e um impulso contrapontístico absolutamente formidável. O segundo movimento é um belo Andante sostenuto. Um Allegretto pastorale serve de intermezzo para o agitado finale, que tem a marcação Allegro coraggioso, bem nielseniana.
O Quarteto op. 44 é mais original e introspectivo que o op. 14. Ele foi composto em 1906 e representa bem o amadurecimento de Nielsen e a busca de uma linguagem pessoal. O primeiro movimento é memorável, com sua característica e hipnótica melodia. O andamento lento é menos indolente e mais sério. O terceiro movimento é marcado Allegretto moderato ed innocente e está entre as páginas mais interessantes escritas por Nielsen para quarteto de cordas.
A Sonata para violino e piano no. 2 foi composta em 1912, um pouco antes de Nielsen iniciar o trabalho na Quarta Sinfonia. É uma obra tremendamente original, que o compositor inglês Robert Simpson - nielseniano dedicado - considerava o pórtico de entrada de Nielsen em sua segunda fase criativa. A tonalidade não é clara, as melodias são angulosas e a parte do piano é percussiva, de escrita muito pessoal. O finale é extremamente reduzido e começa com um tema aparentemente pastoral, que leva a um desenvolvimento caótico: o piano toca oitavas marteladas que lembram indiscutivelmente o "duelo" de tímpanos da Quarta Sinfonia.
Já o Quinteto para sopros é a obra camerística mais famosa e executada de Carl Nielsen. Ela teve origem, quem diria, em uma ligação telefônica! Em 1921, Nielsen telefonou para a casa do amigo pianista Christian Christiansen, que no momento estava ensaiando a Sinfonia concertante para quatro sopros e orquestra, K. 297b, de Mozart, com membros do Quinteto de Sopros de Copenhagen. Enquanto Christiansen atendia o telefone, os sopros continuaram a ensaiar. Nielsen ouviu a música ao fundo e ficou tão encantado que foi à casa do amigo especialmente para acompanhar o ensaio. Ao final, dirigiu-se ao oboísta do grupo, Svend Christian Felumb, e disse que comporia um quinteto para eles.
Nielsen escreveu o seguinte a respeito do Quinteto: "tentei nele representar as diferentes características dos cinco instrumentos. Há passagens em que um tenta interromper o outro, e outras em que todos soam juntos". Nielsen não diz, mas certamente há muito da personalidade dos próprios membros do Quinteto de Copenhagen nessas caracterizações. (Aliás, a fascinação do compositor por personagens característicos é bem sentida em diversas outras obras, mais notavelmente na Segunda Sinfonia, dita Os quatro temperamentos, toda baseada nessa idéia.) Nesse sentido, o coração do Quinteto para sopros é o último movimento, uma série de onze variações sobre um hino luterano da autoria do próprio Nielsen, Meu Jesus, faz meu coração amar. Cada variação tenta representar um diferente aspecto de cada um dos instrumentos ou do conjunto como um todo. As variações 7 e 9, por exemplo, são para fagote e trompa solistas, respectivamente. Ao final das variações, o tema coral é novamente tocado, por todo o conjunto.
Música para piano
Nielsen é principalmente lembrado por suas sinfonias e concertos, mas era um autor extremamente prolífico - não há gênero ao qual não tenha se dedicado. Em sua produção há lugar inclusive para o piano - embora tenha sido freqüentemente acusado de ser um compositor "antipianístico". Suas melhores obras para o instrumento são a Suíte, op. 45, as moderníssimas Três peças para piano, op. 59, a Chacona, op. 32, o conjunto de Tema e variações, op. 14 e as extremamente divertidas peças de Música para jovens e velhos, op. 53.
A Suíte foi composta em 1920 e dedicada ao grande pianista Artur Schnabel, que nunca executou a obra. Uma pena! A peça é certamente uma das melhores compostas para piano no século. Dividida em seis partes, ela tem dois centros de gravidade, o terceiro movimento e o final, que acabam tornando a suíte bastante simétrica. O último movimento é de uma força impressionante e revela traços de Brahms - aliás, a suíte compartilha com as Baladas, op. 10 do mestre hamburguês o mesmo clima cinzento e nebuloso. Curiosamente, Nielsen deu originalmente à obra o título de Luciferiana, relacionando-a com o personagem da mitologia grega, portador da luz. Acabou retirando o título porque o público pensou que ele se referia ao diabo...
As Três peças para piano foram compostas em 1927, após o Festival de Música de Frankfurt, onde Nielsen encontrou-se com Schoenberg e Bartók. A obra é tão ou mais ousada que a Sexta Sinfonia ou que o Concerto para clarinete, com seus ritmos pontuados, temas fragmentados e inúmeras sugestões de atonalidade. É uma música difícil, mas de grande clima, muito atraente.
A Música para jovens e velhos é totalmente diferente. Composta em 1929 para a Sociedade de Professores de Música da Dinamarca, foi pensada como um meio de educação musical. São dois livros contendo 12 pequenos prelúdios sendo os em tom maior seguidos por outro em sua relativa menor. No primeiro livro, o terceiro prelúdio foi dividido em duas partes. Com proposta didática e suas relações tonais, a obra remete claramente ao Cravo bem temperado de Bach, sem ser tão ambiciosa, claro. Há inclusive uma pequena homenagem ao mestre de Leipzig no sétimo prelúdio do segundo livro, dito Alla Bach, onde uma fuga caricata brinca com o estilo bachiano. Para o ouvinte, a impressão é de um desfile imaginário de tipos e situações. Delicioso.