Ontem eu vi esse filme numa sessão tardia de cinema aqui em SP.
Não senti tanto impacto assim, como a maioria das pessoas. Não consegui sentir toda essa emoção e pra mim, será apenas um fenômeno momentâneo, bem esporádico. Do ponto de vista da arte cinematografica e da discussão “Brasil”, acho que “Cidade de Deus” causou muito mais impacto. Provavelmente por mostrar a violência do ponto de vista de um favelado e por ter um roteiro e cinematografia quase primorosos. Sem contar a obra prima que e` o livro do Paulo Lins, bem melhor que o filme.
Na minha opinião, e’ inexplicável pessoas ficarem tão chocadas com o filme, como se fosse algo inédito ou uma descoberta fantástica. Ora, isso e’ a realidade de nosso pais, mesmo um jornal ultra-conservador como o “Jornal Nacional” mostra esse tipo de realidade, quando convem, de tempos em tempos. O que há de tão fantástico nisso, afinal
Talvez seja pelo fato de que a classe media urbana brasileira no geral, desconheça sua própria realidade (essa e` velha)
. Viva entorpecida por esqueminhas de novelas que apresentam sempre os mesmos personagens e enredos; praticamente e’ iletrada, cega e surda uma vez que não lê, não vê e não escuta; talvez porque somente nessas horas essa gente se lembre que existe esse Brasil esquecido; talvez porque tudo seja doloroso pra ela, pura preguica; ou talvez por puro entretenimento, falta absoluta do que comentar, fazer e discutir.
O fenômeno “Tropa de Elite” e’ similar ao Cidade de Deus, Racionais MC (quando explodiram com “Sobrevivendo no Inferno”), Funk Carioca e outras coisas ‘exóticas’ que vem dos guetos e dos setores marginalizados da sociedade. Entra naquela velha discussão de querer julgar sem entender, como dizer que o Hip-Hop incita a violencia sem ao menos saber do que se trata, do que esta envolvido, etc...
Me lembro quando estava assistindo Cidade de Deus no cinema e uma senhora que devia ter seus 50 anos, de tempos em tempos repetia a seguinte frase: “nossa gente, que lugar e’ esse!”
Esse lugar e’ o Brasil que não chega ate’ as salas de cinema de um shopping porque e’ barrado na portaria antes de entrar. Na verdade o Brasil as vezes me lembra uma grande farsa, uma daquelas pecas de Goethe onde tudo e’ linha de montagem.
Agora, o filme em si e’ decepcionante em vários aspectos porque leva a discussões que beiram a ingenuidade. Como o de querer “culpar” os jovens de classe media pela violência frenética e de consumir todas as drogas que são produzidos no morro. Ora, a questão e’ muito mais complexa e envolve um universo muito mais amplo do que uma meia dúzia de universitários fumando um baseado. A questão das drogas e’ um esquema de criminalidade em escala global, um problema que vem desde políticas absurdas impostas pela nação mais conservadora, hipócrita e idiota que já existiu na historia, os Estados Unidos, passando por uma rede de corrupção, pobreza e conivência que vai muito alem de um cigarro de maconha que morre na boca de um desembestado qualquer.
O problema das drogas e’ um problema em escala de política global. A atual política adotada não tem como dar resultados e fatalmente vai levar (já levou) o atual sistema de justiça criminal a falência. Os EUA gastam uma fortuna no combate as droga todo ano, no entanto, elas estão cada vez mais baratas, puras, eficientes e mais fáceis de achar. O que indica mercado abastecido como nunca e oferta/procura cada vez maiores. Então isso e’ burrice, alguma coisa precisa ser mudada.
Mas enfim, a questão e’ tratada do ponto de vista simplista no filme, de um capitão desequilibrado pelo stress emocional que acha que o seu pupilo, foi fraco por não ter dado flagrante nos colegas de universidade.
Muito ingênuo.
O filme por outro lado e’ feliz quando fala sobre a guerra urbana. Sim, numa guerra não existem heróis e nem mocinhos, existe apenas a sobrevivência de ambos os lados, e nisso o perfil do capitão Nascimento se encaixa bem. E são os infelizes dos soldados, precariamente armados que vão carregar a bandeira do pais. O filme escracha legal o esquema de corrupção na policia, o anacronismo das políticas publicas e o amadorismo das táticas, contra bandidos armados ate’ os dentes com disposição pra tudo. E’ guerra, vale tudo.
O Brasil vive essa guerra há séculos, porem, deixa cada dia mais insuportável a sobrevivência nas grandes cidades. Pelo visto, a população de SP já se esqueceu do estrago que o PCC fez por aqui há menos de 1 ano atrás. Provavelmente os que tem poder em nossa cidade estão apenas esperando o caos se repetir para tentarem tirar proveito político da situação, mais uma vez. Ou, os que foram ao shopping ver Tropa de Elite, a maioria, moram em regiões que não foram afetadas pelos distúrbios da cidade. Então, fodaz, pensar nisso pra que
Legal também a escrachada em cima dos setores burros da socidade dos ‘politicamente corretos’, das multiplicações das ONGs sem pe’ e nem cabeça.
Mas voltando ao filme:
1) Daria uma nota 3 numa escala de 0 a 5.
2) Roteiro apenas regular, sem grandes novidades.
3) Esteticamente um filme normal, não muito diferente dos policiais hollywoodianos que se tem por ai.
4) Sobre a questão do treinamento militar do BOPE, vale citar o filme “Nascido para Matar” (Full Metal Jacket) de Stanley Kubrick; e sobre a questão do uso de drogas por jovens de classe media e os esquemas globais, vale citar o filme “Traffic” de Steven Soderbergh.
5) O documentário do diretor Jose Padilha sobre o “Ônibus 174” me pareceu mais humano, polemico e interessante que esse sobre o BOPE. Mas vai convencer o publico de shoppings a gostar de documentários e muito menos, da vida sofrida dos descamisados...