Sobre o direito à imagem
" Nos termos do Código Penal, a divulgação, por qualquer meio e com intenção de devassa, de factos ou circunstâncias inerentes à vida privada de alguém, nomeadamente relativos à intimidade da vida familiar ou sexual ou a doenças graves, é, em termos genéricos, punida criminalmente com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias.
A intenção de devassar é entendida como a mera intenção de procurar tornar público o que era secreto. O conceito de vida privada não se encontra definido legalmente, sendo a sua definição feita casuisticamente pelos tribunais. Inclui, naturalmente, a vida íntima, nomeadamente a afectiva, sexual e familiar ".
Sobre a difamação e injúria
" O crime de difamação consiste na ofensa à honra ou consideração de alguém através da imputação de um facto, mesmo que sob a forma de suspeita, ou através da formulação de um juízo e que é feita dirigida a terceiros. Quando a imputação dos factos ou juízos ofensivos é feita directamente ao visados, o crime em causa é o de injúria ".
Sobre o lenocínio
" O lenocínio é um crime previsto e punido pelo Artigo 170º do Código Penal. “Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição ou a prática de actos sexuais de relevo é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos ".
Para abrir esta minha intervenção resolvi destacar da lei as definições sobre os crimes, constantes em código penal, contra o direito à imagem, de devassa da vida privada e lenocínio. Não sou jurista, que me perdoem os distintos doutores em Direito por estar a meter a foice em seara alheia. Faço-o por não ter visto os nobres causídicos pronunciarem-se alguma vez sobre tais crimes no quadro dos fora de opinião de clientes de acompanhantes, que tem animado os propósitos deste meu blog, e continuará a ser razão dos meus textos no futuro.
Feito o preâmbulo, estão pois criadas as condições para passar ao artigo desta semana. Não sem antes fazer uma pequena resenha histórica que lhe sirva de base, a partir da qual ficará melhor fundeada esta minha intervenção, espero eu.
Por volta do ano 2004, apareceu uma secção portuguesa num forum brasileiro de opinião de clientes de acompanhantes, o gp-guia. Basicamente, procurava constituir-se como um arquivo de informações sobre as profissionais a operar também, em território português, não só brasileiro, que pudesse ser consultado pelos interessados em procurar a companhia profissional de mulheres.
Uma linguagem assente em termos muito específicos, próprios à classificação feita pelos constituintes sobre as profissionais "testadas", emanava do forum para outros que iam aparecendo à sua volta sempre motivados pelo sucesso crescente do gpguia, que hoje abrange cerca de uma dezena de milhar de membros. Até ao ano 2007 foram abertos, pelo menos, outros 4 fora cujos termos adoptados para a classificação das profissionais eram e são os mesmos usados pelo forum de origem brasileira (e.g. TD; Test Drive, GP; Garota de Programa, PISADA NA BOLA; Marcação cancelada por parte da acompanhante). Ficará provada assim a influência do primeiro forum para o aparecimento dos seguintes entretanto criados, em Portugal, por portugueses.
Durante a fase em que a internet era ainda um advento recente, e depois disso, entre os anos de 1998 e 2002, assistiu-se ao aparecimento crescente de agências das acompanhantes em Portugal. O aparecimento desses "novos operadores", agenciadores de serviços de acompanhamento, foi possível por terem os recursos informáticos e know how que faltavam às próprias profissionais. A web era ainda um enorme desconhecido e apesar de assistir-se a uma concorrência feroz impuseram-se algumas organizações informais (to say the least). Escort Portugal e Klasscenter tornaram-se respectivamente líder e sub-líder do negócio das acompanhantes ditas de "luxo", termo que teve aí origem, hoje vulgarizado pelos mass media e a web. Contudo, para que se compreenda melhor a importância das agências, o tratamento da prostituição, em termos de imagem, ganhou um standing que resguardava melhor e dignificava o papel das profissionais. Fosse enquanto acompanhantes ou, enquanto mulheres, na sua condição feminina.
Ora com o aparecimento do gpguia, em 2004, depois de cerca de dois anos de estabilização do mercado concentrado nas agências, operou-se uma nova viragem que acabou por conduzir à banalização da prostituição e permitiu, inclusivamente, criar um respaldo efectivo em favor das profissionais brasileiras e, em geral, de baixo preço e práticas lesivas para a saúde como a felação desprotegida. Leia-se assim a influência capital do gpguia para a história da prostituição em Portugal a partir do segundo mlénio.
Ora tendo em conta estes factos, ficará não só provado pelos termos e formas utilizados actualmente por outros foruns, mas também pela sedimentação das profissionais brasileiras em Portugal e práticas procuradas por parte de clientes, como é o caso da felação; que o gpguia terá tido um papel central na promoção da própria prostituição junto da sociedade civil e sobretudo das camadas mais jovens. Além disso, terá hoje um poder de influência concreto que as profissionais devem, grossomodo, levar em conta.
Em termos de análise, no que estipula a lei portuguesa, parece-me que este novo poder, sobretudo quando exercido por figuras sem nome real que relatam factos raramente reais, como é o caso do gpguia, acabará por incorrer em vários crimes.
Ao beneficiar profissionais através de relatos, o forum está, inexoravelmente, a (cito) "fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição". A intenção lucrativa é suficientemente clara porque o forum encontra a essência da sua razão na prostituição, sem essa perdê-la-ia. Por outro lado, ao permitir relatos, ainda por cima pouco verosímeis, o gpguia e outros fora de opinião de clientes de acompanhantes acabam por levar ao público um conjunto de factos sobre a intimidade das mulheres que vendem o seu tempo de companhia. Tem assim, em meu entender, (cito) "a mera intenção de procurar tornar público o que era secreto" e, ainda mais, porque os factos tornados públicos tratam sobre "a vida íntima, nomeadamente sexual" das acompanhantes visadas. Ao relatar negativamente os famigerados e supostos encontros, contudo, acaba prejudicando a actividade profissional das mulheres visadas pelos relatos e provocará perdas e danos que há muito se encontrarão por reclamar.
Foi S.Exa. o senhor Presidente da República, Anibal Cavaco Silva, que se referiu à importância da inclusão social na agenda política nacional. Foi o senhor primeiro ministro José Sócrates quem prometeu apostar num Portugal mais tecnológico, dotado com mais e melhores meios ao alcance de todos, até os mais jovens, nas escolas (sentidos parabéns pela capacidade demonstrada em termos de e_government). Ora ao deixar passar em claro os crimes contra muitas liberdades e direitos dos cidadãos, todos os cidadãos, atentos os deveres que estão por cumprir na web; o governo português estará, aceite ou não, a permitir indirectamente a promoção de um conjunto de situações menos claras, como poderá ser o caso da promoção da prostituição nos fora de opinião de clientes de acompanhantes, do atentar contra os direitos e liberdades das profissionais e contra a saúde. Se assim for, os novos meios colocados ao serviço dos portugueses em matéria de tecnologia poderão transformar-se em autênticas autoestradas da desinformação, e ampliar os aspectos negativos que sobressaiem do autêntico "lado negro" da "e_force". Poderão, além disso, ser cada vez mais os casos de novos infectados por HIV, que emanarão de práticas como a felação desprotegida promovidas por estes fora, não apenas no gpguia, que o orçamento da saúde terá que pagar mais cedo ou mais tarde...
Se tudo isto vier a acontecer, devem oposição ao governo e opinion leaders permanecer em silêncio e solidariedade para com o executivo. Até à data partilharam a omissão de um aspecto que devia ter preocupado todos, não fosse nascer em paralelo à sociedade uma nova espécie de cidadania virtual na web, muito menos cumpridora do que mandam lei e bom senso, e mais predisposta para atentar contra os demais cidadãos.
Cavaco Silva já deu a tónica, repito-me. A inclusão é precisa... Mas em Portugal, já estou como o outro, "Eles só falam, falam, falam, falam, mas não dizem nada"...
Um beijo,
Elisabeth Butterfly